GAZETA DO POVO - 05/04
Governo da Venezuela, já habituado a tomar da iniciativa privada imóveis comerciais, agora se volta aos donos de imóveis residenciais
O ditador venezuelano, Nicolás Maduro, segue disposto a fazer seu país rumar na direção do caos e do desrespeito completo aos mais básicos dos direitos individuais. Se em 2011 o caudilho Hugo Chávez manifestou o desejo de “expropriar” (o eufemismo comunista para o roubo cometido pelo Estado) as propriedades no balneário caribenho de Los Roques, agora Maduro coloca em prática outra violência, ao dar a proprietários meros 60 dias para vender, a preços muito camaradas, imóveis que estejam sendo habitados pelo mesmo inquilino há pelo menos 20 anos. Se alguém ainda tinha dúvidas de que o direito à propriedade já não vigorava na Venezuela, agora pode ter certeza absoluta disso.
A fúria de expropriações começou pelas empresas. Chávez não tinha o menor escrúpulo em nacionalizar empresas de agronegócio, siderúrgicas, petrolíferas, metalúrgicas, fazendas e supermercados. No fim de 2013, com a Venezuela já vivendo uma grave crise de abastecimento cujo maior símbolo é a falta de papel higiênico nos supermercados, Maduro, eleito para suceder ao falecido Chávez, ordenou a invasão da rede de lojas Daka, mandou prender gerentes e promovou uma “liquidação bolivariana”, com eletrodomésticos sendo vendidos por menos da metade de seu preço. Mas o ato desta semana indica que a ditadura bolivariana não está satisfeita em tomar para si imóveis comerciais: agora, também quer os residenciais.
Em qualquer democracia, ninguém pode ser forçado a se desfazer de sua propriedade a não ser sob circunstâncias muito específicas, como um evidente interesse público. Mesmo assim, o proprietário tem direito a uma indenização justa. É um princípio tão óbvio que até mesmo Hugo Chávez o deixou escrito na Constituição bolivariana que promulgou. Mas, como diz o ditado, o papel aceita tudo: importa a maneira como se aplica a Constituição, e os três poderes venezuelanos há muito deixaram claro que o texto de nada vale: basta recordar como a lei maior do país foi atropelada para permitir que Chávez tomasse posse de um novo mandato mesmo estando moribundo, em um hospital de Havana. Em comparação com o circo montado por ocasião da posse, roubar imóveis de seus legítimos proprietários soa como tirar doce de criança.
À violência contra os proprietários de imóveis residenciais soma-se a continuação da repressão nas ruas aos protestos de oposição, e especialmente a resposta bolivariana à tentativa da deputada Maria Corina Machado de retomar seu trabalho de parlamentar. Corina teve seu mandato ilegalmente cassado por Diosdado Cabello, presidente da Assembleia Nacional venezuelana, em uma dupla violação da Constituição: primeiro, porque as razões alegadas por Cabello não se aplicavam no caso de Corina, que aceitou uma oferta do Panamá para poder falar sobre a ditadura venezuelana em uma reunião da OEA; segundo, porque a cassação ocorreu sem processo no Judiciário venezuelano – o Tribunal Supremo de Justiça não a julgou, limitando-se a simplesmente referendar a decisão de Cabello. Na terça-feira, Corina tentou entrar no Parlamento, mas as milícias chavistas a impediram; a polícia usou gás lacrimogêneo para dispersar tanto os apoiadores de Corina quanto os bolivarianos.
Corina veio ao Brasil para falar diante do Senado brasileiro na quarta-feira, denunciando o crescente autoritarismo do governo venezuelano – agora ressaltado até pela conferência episcopal do país – e apelando ao Brasil para que deixe de fazer o lamentável papel de cúmplice da ditadura que vem exercendo até agora. Corina aproveitou os 50 anos do golpe de 1964 para apelar a Dilma Rousseff, perseguida pelos militares durante a ditadura. “Esperamos que todos os líderes que sofreram perseguição tenham solidariedade, uma empatia maior com o que estamos vivendo na Venezuela”, disse Corina. Parece difícil que o pedido seja atendido, pois, para o petismo, Maduro é um democrata, independentemente do que faça, e Corina é a “golpista”, de acordo com essa maneira de pensar que confere à esquerda o monopólio da bondade.
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