O GLOBO - 26/03
Como no boliche, o governo Dilma, ao intervir na formação de preços de combustíveis e energia elétrica, além de outros erros, derrubou de uma vez Brasil, Petrobras e Eletrobras
Houve quem apostasse que a Standard&Poor’s teria sensibilidade política e rebaixaria a nota do Brasil apenas depois das eleições. Que o país cairia de patamar, era considerado certo. O calendário eleitoral, por fim, de nada valeu, e a S&P reduziu a avaliação do risco brasileiro de BBB para BBB-, mantendo-o, porém, na faixa de “grau de investimento", com viés de estabilidade, ao lado de Marrocos e Espanha, logo abaixo de Itália e África do Sul. Os dois países europeus tentam erguer-se dos escombros da crise continental.
Não se sabe se a agência decidiu divulgar logo seu diagnóstico depois que analistas seus acompanharam no Brasil o anúncio da fórmula engendrada para manter a tarifa de energia elétrica subsidiada em ano eleitoral, maquiando parte do subsídio por meio de um empréstimo bilionário de bancos a uma entidade, a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), sem ativos para apresentar como garantia de crédito. Mais um lance da criatividade contábil que contribuiu para o rebaixamento do país.
Em abril do ano passado, a S&P colocou a nota do Brasil em viés de baixa. Não foi, portanto, por falta de aviso. Tanto que o comportamento do dólar e bolsa, ontem, sancionou a análise de que os mercados já haviam precificado o rebaixamento: o dólar caiu e a bolsa subiu.
Mas é preciso cuidado, porque a economia está à beira de ser colocada na vala comum dos investimentos “lixo”, em que os custos de captação por empresas e entidades em geral brasileiras ficarão ainda mais caros. Relembre-se que vários fundos de investimentos globais são proibidos de aplicar em papéis com classificação abaixo do “nível de investimento". A torcida é para que conhecidos espíritos voluntariosos e salvacionistas que transitam por Brasília entendam o recado de uma vez por todas: os malabarismos contábeis e o intervencionismo econômico se esgotaram. Tudo isso somado à leniência com a inflação tem um efeito demolidor na confiança em relação ao país.
Pode-se comparar tudo a uma jogada de boliche: na mesma tacada de congelar combustíveis na ilusão de combater a inflação — na verdade, isso é administrar o IPCA e não debelar alta de preços —, intervir de forma desastrada no setor elétrico e terminar subsidiando pesadamente a conta de luz, além de tentar mascarar a degradação fiscal na contabilidade pública, o governo Dilma conseguiu, ao mesmo tempo, contribuir para o rebaixamento da nota de risco do país e também da Petrobras e Eletrobras. Fez um strike
Não há crise grave à espreita do Brasil. O país é credor externo, situação diferente da do passado. Mas tudo vai depender de como o governo metabolizará o tranco. Se for na linha, tradicional de hostes petistas, de desqualificar as agências, será grave erro. Elas têm muitos flancos abertos (não previram crises e foram cúmplices no estouro da bolha imobiliária nos EUA que levou o mundo à Grande Recessão), mas continuam referência no mercado global. Queiram ou não.
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