O GLOBO - 15/03
As térmicas encareceram a energia, formando uma bomba financeira. O governo poupou, por enquanto, o consumidor, mas a bomba continua armada
Uma bomba financeira estava em gestação no setor elétrico. Devido à falta de chuvas na região Sudeste e à queda do nível dos reservatórios, as usinas térmicas precisaram ser acionadas a pleno vapor. Várias dessas usinas foram planejadas para uso emergencial, mas, no quadro atual de escassez, se tornaram permanentes. Tais térmicas queimam óleo diesel ou óleo combustível e, por isso, têm um custo de geração bem mais elevado que o de usinas hidráulicas, eólicas, ou mesmo térmicas movidas a biomassa, gás natural e carvão.
Pelas regras em vigor, o custo adicional deve ser repassado às tarifas cobradas dos consumidores na data de revisão anual. No entanto, o impacto financeiro do encarecimento de energia é imediato no segmento de distribuição. As companhias distribuidoras contratam com cinco anos de antecedência, em leilões promovidos pela agência reguladora do setor elétrico (Aneel), a energia que entregarão aos chamados clientes cativos (residenciais e pequenos estabelecimentos). Nesse prazo, é difícil se prever com exatidão as quantidades que poderão ser ofertadas ou consumidas. Dessa forma, a energia excedente das companhias geradoras ou a que ultrapassa a previamente contratada pelas distribuidoras tem de ser comercializada por preços definidos em um modelo matemático que leva em conta o nível dos reservatórios (nos quais se acumula energia) e o acionamento de usinas térmicas emergenciais. Nos últimos meses, os preços dispararam em função do esvaziamento dos reservatórios e da intensa participação das térmicas no fornecimento de eletricidade.
O governo já havia decidido que este ano, por motivos eleitoreiros, o consumidor não iria arcar com qualquer custo adicional no fornecimento de energia. E fez uma provisão, em um dos fundos do setor elétrico, para cobrir diferenças.
Na verdade, virou pó o modelo engendrado por Dilma, sem maiores discussões, de intervir no setor, forçando as estatais a renovar as concessões e a cortar as tarifas em 20%, número que subirá nos palanques. Mas agora em março foi possível dimensionar um enorme rombo nessa conta. As distribuidoras iriam à falência se tivesse que arcar com a defasagem entre o preço do combustível e o da energia: algo próximo dos R$ 20 bilhões. Na quinta-feira, o governo anunciou um remendo. O Tesouro entrará com mais recursos para cobrir a diferença (e para tal deverá elevar imposto, ainda que não tenha sido definido exatamente qual). Um empréstimo às distribuidoras — via empresa que centraliza a comercialização de eletricidade no mercado livre — cobrirá outra parte. Os juros serão pagos, claro, pelos consumidores — a partir do ano que vem, é certo. O quanto de subsídio que estará embutido nesse empréstimo não foi revelado. Talvez nem se saiba.
Tudo feito a fim de empurrar o choque tarifário para o ano que vem. O remendo não eliminou a bomba financeira. Apenas deu mais previsibilidade a ela.
Nenhum comentário:
Postar um comentário