O GLOBO - 04/02
Os salários são livremente negociados no Brasil desde a criação do real. O plano que livrou a economia brasileira de um processo de superinflação crônica buscou desarmar a indexação de curto prazo, atrelada à alta de preços ocorrida anteriormente, que contribuía para uma corrida sem fim entre preços e salários.
Empregados e empregadores geralmente levam em conta, na livre negociação, a corrosão sofrida pelos salários quando a inflação se mantém acima de percentuais admitidos como movimentos de acomodação dos preços decorrentes de flutuações passageiras.
No entanto, essa livre negociação também têm como referência o comportamento do mercado de trabalho e a situação financeiras das empresas no curto e médio prazos.
Não há, assim, uma indexação formal para os salários. A exceção é o salário mínimo. Fixado por decreto presidencial, o mínimo é passível de injunções políticas.
Há uma política deliberada de valorização do mínimo que assegurou ganhos expressivos tanto para trabalhadores como para a grande maioria de aposentados e pensionistas da previdência social. Essa política tem impacto ainda sobre os salários que estão ligeiramente acima do piso.
Em uma tentativa de estabelecer alguma previsibilidade para essa política de valorização deliberada do salário mínimo, instituiu-se uma regra de ajuste anual que incorpora a inflação do ano imediatamente anterior ao do ajuste somada a um ganho real equivalente à variação do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes.
Se por um lado tal regra de fato deu previsibilidade à política de de valorização do mínimo, por outro instituiu um mecanismo de indexação que ignora a conjuntura. A variação do PIB de dois anos antes pode não ser mais compatível com a situação da economia no momento em que o ajuste é repassado ao salário mínimo.
Tal regra tem data para terminar: 2015. A indexação automática, e inflexível, não pode se perpetuar. Pela importância do salário mínimo no conjunto da economia brasileira, essa indexação se transformou em fonte de pressão sobre a inflação (direta e indiretamente, em especial quando aumenta a folha de pagamentos do setor público e o déficit da previdência social).
A valorização do salário mínimo é bem-vinda e necessária, mas não pode ignorar as condições da economia. Se a evolução dos salários não tem relação com a produtividade do trabalho, a política de valorização deliberada do mínimo tira competitividade das cadeias produtivas (pela elevação dos custos). A perda de competitividade acaba fechando postos de trabalho, o que impede que mais categorias profissionais se beneficiem do crescimento econômico. Desse modo, em vez de se conseguir que haja um avanço da massa salarial, asfixia-se a galinha dos ovos de ouro.
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