O Estado de S. Paulo - 14/01
Derrotado pela inflação de 5,91% em 2013, o Comitê de Política Monetária (Copom) reúne-se hoje e amanhã para definir os próximos lances do combate à alta de preços. A situação está longe de ser rotineira e está em jogo, mais uma vez, a credibilidade da instituição. Durante todo o ano, o comitê, formado por diretores do Banco Central (BC), prometeu um resultado melhor que o do ano anterior, de 5,84%. Foi a mesma promessa convertida em mantra pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. A única diferença foi a linguagem. No jargão do BC, o objetivo era fazer a inflação convergir para a meta oficial, de 4,5%, embora lentamente. Em linguagem comum, a tarefa era conseguir uma taxa menor que a de 2012 e com tendência de queda nos dois anos seguintes. Nenhum item desse programa foi cumprido e os primeiros números coletados em janeiro indicam pressões inflacionárias crescentes.
Diante do fiasco, alguém teria de falar em nome do BC sobre a disparada do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), usado como referência para o regime de metas de inflação. O indicador mostrou resistência "ligeiramente acima" da esperada, afirmou em nota o presidente da instituição, Alexandre Tombini. Além disso, "a inflação se posicionou dentro do intervalo de tolerância fixado para o ano".
Em outras palavras, o quadro teria sido pior, se o acumulado ficasse acima de 6,5%. É quase escandaloso o presidente do BC usar um argumento como esse. Margem de tolerância, ele sabe muito bem, é para acomodar eventos excepcionais. Não houve nada parecido em 2013.
Mais surpreendente que os números finais, no entanto, é a alegação de surpresa. A alta de 0,92% em dezembro ficou acima das projeções conhecidas, mas a aceleração dos aumentos, muito clara a partir de agosto, estava embutida em todos os cálculos sérios. Falar em surpresa diante de um salto pouco maior que o esperado é quase enveredar, como diria Sérgio Porto, pelo perigoso caminho da galhofa. Não deve ter sido essa a intenção do presidente do BC. Mas o Copom deve uma demonstração mais clara de empenho no tratamento da inflação. Mesmo um resultado pouco abaixo de 5,84% em 2013 teria sido muito ruim pelo menos por três motivos, para citar só os mais evidentes.
Primeiro, os números oficiais do ano passado vieram com maquiagem, por causa das intervenções políticas em preços e tarifas. Sem esses truques, a taxa anual teria chegado a 6,71% e estourado a margem de tolerância, segundo cálculo publicado no Estado de sábado.
Segundo, a meta de 4,5%, com margem de 2 pontos porcentuais, é muito mais alta que a de países governados mais seriamente - incluídos alguns sul-americanos.
Terceiro, porque a tolerância à inflação abre espaço à farra fiscal (gastança, concessão arbitrária de benefícios, promiscuidade entre Tesouro e bancos oficiais, etc.), além de produzir outros desarranjos graves (no câmbio, por exemplo). Parte dos problemas enfrentados pela indústria brasileira no comércio internacional está associada aos desajustes cambiais. Para alguns economistas, o problema está na gestão cambial. Errado: a tolerância à inflação é muito mais grave.
Ao retomar a elevação dos juros em abril de 2013, o Copom começou a recobrar sua credibilidade e a mostrar-se capaz de tomar decisões independentes, sem se dobrar às opiniões formuladas no Palácio do Planalto. Mas sua reação, além de tardia, foi insuficiente para compensar os desmandos cometidos pelo governo em outras áreas.
A credibilidade do Executivo perante as pessoas informadas está obviamente comprometida. O resultado fiscal de 2013 - um superávit primário de R$ 75 bilhões, segundo o ministro da Fazenda - foi obviamente inflado. Além de receitas atípicas, como os R$ 15 bilhões do bônus do Campo de Libra, o governo usou vários outros componentes para melhorar o resultado, como o grande aumento dos restos a pagar e o atraso em transferências a Estados e municípios. Ao decidir o próximo passo, os membros do Copom deveriam levar em conta a crise de confiança na gestão federal e os custos do agravamento dessa crise.
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