GAZETA DO POVO - PR - 05/01
Como a insatisfação popular com os rumos da política, manifestada nos protestos de 2013, pode ser canalizada para as urnas em 2014?
Dois acontecimentos marcaram o país no ano que terminou: a condenação dos políticos da cúpula do PT envolvidos no escândalo do mensalão e as manifestações de junho, que levaram cerca de 2 milhões de pessoas à rua no Brasil. O primeiro acontecimento foi marcante porque, pela primeira vez desde a redemocratização, diversas personalidades políticas envolvidas em compra de apoio político com dinheiro público foram condenadas pelo Supremo Tribunal Federal. O segundo, entretanto, tem um valor especial pela magnitude que tomou no meio do ano e pela expectativa de mudança que gerou na sociedade.
É possível constatar a expectativa de mudança a partir de números. Recentemente, o Instituto Paraná Pesquisas realizou um levantamento a pedido da Gazeta do Povo e constatou que 79% dos brasileiros apoiam as manifestações que ocorreram em junho. A pesquisa indicou que os motivos dos protestos, segundo os entrevistados, foram corrupção (33%), deficiência do transporte público (23%), Copa do Mundo (20%) e situação econômica (16%). Mas, se por um lado os cidadãos do país viram com bons olhos as manifestações e as diferentes causas defendidas, por outro as pessoas também acham que as “jornadas de junho” não tiveram sucesso. De acordo com a pesquisa, 53% dos entrevistados consideram que as manifestações não mudaram o país e 68% afirmaram que não houve melhorias nas cidades em que vivem depois dos protestos.
Essa percepção da maioria da população brasileira corresponde, em grande medida, à realidade. Muito pouco da “pauta prioritária” decorrente das manifestações foi votada no Congresso Nacional. A reforma política não chegou nem sequer a ser levada a sério pelos parlamentares. Os “cinco pactos” citados por Dilma Rousseff em junho quase nem foram mencionados no pronunciamento de fim de ano da presidente. O tema dificilmente será tratado em 2014, ano eleitoral. Um cenário como esse pode parecer desolador.
Analisando agora, meses depois, parece decepcionante para os cidadãos que foram às ruas constatar que pouco se avançou. A frustração, entretanto, é o caminho daqueles que acreditam que profundas mudanças podem ser realizadas apenas indo para as ruas protestar.
A realidade não funciona assim. A mudança da cultura política é possível, mas para fazê-la acontecer também é preciso atuar no longo prazo. Começa agora um ano de eleições presidenciais e estaduais. Até outubro haverá um amplo espaço para que a energia dos manifestantes de junho se materialize em ações concretas para melhorar a qualidade da política brasileira.
O primeiro e mais simples caminho é não desperdiçar o voto com maus candidatos. Não aceitar trocar voto por dinheiro, jantares ou favores. Se um político precisa oferecer bens materiais para conquistar sua confiança, já começou errado ao tentar comprar o voto. É importante também gastar tempo para conhecer o passado do candidato, saber o que ele já fez pela comunidade e quais ideias defende. Se o político estiver tentando a reeleição, é bom saber como se comportou durante o mandato, como gastou o dinheiro da verba de ressarcimento, como se manifestou em votações importantes.
Ainda é possível ir além do simples ato de votar. É possível ajudar os demais eleitores a também escolher de forma consciente seus candidatos – fiscalizando os atos daqueles que já estão no poder, analisando as contas de campanha, exigindo que os candidatos divulguem quem são seus doadores eleitorais. Há muito o que fazer com a energia das manifestações de junho. E será um desperdício se aquele potencial criativo não for reaproveitado.
Votar bem é uma forma de evitar novos casos de corrupção, desvio de recursos públicos e escândalos políticos, como foi não apenas o mensalão, mas todos os episódios que presenciamos em 2013 e que indignaram o país.
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