O Estado de S.Paulo - 05/12
Em mais uma lição de otimismo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, descobriu um lado bom no pibinho do terceiro trimestre, quando o valor da produção foi 0,5% menor que nos três meses anteriores. Para o senso comum, esse resultado foi um tropeço e vale como advertência. Pode ser um indício de mais estagnação à frente. Para o ministro o cenário é outro. Sua tese singela é a seguinte: assim como o bom desempenho no segundo trimestre prejudicou o do terceiro, o do terceiro, considerado fraco pelo juízo vulgar, tornará mais fácil um bom resultado nos três meses finais do ano. Duas outras afirmações completam o discurso otimista: a crise global está sendo vencida e o Brasil, como tantas outras economias, está em recuperação gradual.
Mostrar-se animado e confiante pode ser um dever de ofício, mas também é recomendável um pouco mais de respeito ao senso comum e aos fatos mais evidentes. Pelos padrões geralmente aceitos, o resultado do terceiro trimestre foi claramente pífio e nada surpreendente. Do lado da oferta, o pior desempenho, em termos estatísticos, foi o da agropecuária, com recuo de 3,5%, mas esse número de nenhum modo indica uma tendência econômica.
A agropecuária foi o setor mais dinâmico ao longo do ano, com produção 8,1% maior que a de igual período de 2012, e no acumulado de 12 meses, com crescimento de 5,1%. A estagnação industrial - no trimestre, no ano e em 12 meses - é o dado realmente significativo. A indústria cresceu apenas 0,1% do segundo para o terceiro trimestre, 1,2% de janeiro a setembro e 0,98% em quatro trimestres. Nesse período, a indústria de transformação avançou apenas 1,4%, sem compensar o desempenho miserável de 2012.
A indústria, principalmente no segmento de transformação, reflete mais dramaticamente que outras atividades os problemas gerais de eficiência e de competitividade da economia brasileira. A estagnação do setor é irmã gêmea da piora do comércio exterior brasileiro. De janeiro a novembro o País acumulou um déficit de US$ 89 milhões na conta de mercadorias - na prática, um aparente equilíbrio. Mas o resultado seria muito pior sem os US$ 6,58 bilhões proporcionados pela exportação fictícia, para efeito fiscal, de plataformas de petróleo.
A ineficiência geral da economia, ainda superada com algum sucesso pela agropecuária, está obviamente associada ao baixo nível de investimentos. Segundo o ministro da Fazenda, o governo hoje aposta principalmente na acumulação de capital fixo - máquinas, equipamentos, instalações empresariais, construção civil e infraestrutura - para impulsionar o crescimento econômico. Esse investimento, segundo ele, está aumentando e é o principal fator de dinamismo econômico. Mas é preciso examinar com alguma reserva também essa conversa.
O total investido diminuiu 2,2% do segundo para o terceiro trimestre. Esse número deve ser explicável pela desconfiança dos empresários e pela inépcia do governo como investidor. Mas sobram alguns números aparentemente animadores e é preciso examiná-los.
No terceiro trimestre, a formação bruta de capital fixo foi 7,3% maior que a de julho a setembro de 2012. Em nove meses, a diferença positiva ficou em 6,5%. Em quatro trimestres, chegou a 3,7%. Mas os números ficam bem menos bonitos, quando se leva em conta a queda do investimento em 2012. Examinados com mais atenção, os dados indicam, no ano, uma expansão de apenas 2,35% em relação aos primeiros nove meses de 2011. Em quatro trimestres, o total investido foi 1,21% maior que o de dois anos antes.
O próprio ministro Guido Mantega desestimula qualquer otimismo, ao mencionar um prazo de dez anos para o investimento chegar a 24% do PIB, proporção alcançada há tempos em outros países em desenvolvimento e superada em vários. No terceiro trimestre, a relação ficou em 19,1%. O ministro, no entanto, insiste em apostar em melhores tempos. Mas o que virá depois da tempestade: a bonança, como promete o velho provérbio, ou a ambulância, como dizia Vicente Matheus? Mas até para a ambulância é necessário planejar e poupar - atividades fora de moda em Brasília.
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