O Estado de S.Paulo - 15/12
Em depoimento no Senado, na terça-feira, o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, disse que "não há nova matriz econômica" e acrescentou: "Ninguém com responsabilidade na área econômica da atual administração" defende mudar a matriz - arranjo arquitetado pelo Ministério da Fazenda para substituir o tripé herdado da gestão FHC (inflação na meta, câmbio flutuante e superávit primário elevado).
Tombini também reprovou a troca do indexador da dívida dos Estados e prefeituras, igualmente proposta pela Fazenda: "A palavra é de cautela para qualquer mudança nessa arquitetura fiscal que foi construída no País" - outra herança bem-sucedida da gestão FHC. Neste item ele advertiu para o caos financeiro que na década de 1980 imperava em Estados e prefeituras e elogiou a renegociação de suas dívidas com a União, a proibição para bancos estaduais emitirem títulos de dívidas e a privatização desses bancos - tudo planejado e realizado no governo FHC.
Funcionário de carreira do BC desde 1998, Alexandre Tombini acompanhou de perto os governos FHC, Lula e Dilma. Ele não é tucano nem petista, é um técnico que tenta - sempre que pode - dar caráter técnico às suas análises e decisões. Já o ministro da Fazenda, Guido Mantega, é ligado ao PT desde antes da eleição de Lula e suas análises e decisões invariavelmente têm forte viés político, sobretudo quando ele faz previsões para o futuro - nunca concretizadas. Junto com sua equipe, há pouco mais de um ano ele arquitetou a "nova matriz econômica", que consiste na desvalorização do câmbio, queda da taxa de juros e redução da meta fiscal para acomodar investimentos.
Há um ano, em 17 de dezembro de 2012, em entrevista ao jornal Valor Econômico, o secretário de Política Econômica da Fazenda, Márcio Holland, explicou o significado da "nova matriz", sustentou que o movimento de transição para ela já estava completado e fez previsões econômicas para 2013, já sob seu efeito. Vejamos o que ele previu e o que aconteceu:
Juros: "As taxas de juros não voltarão aos níveis anteriores", garantiu o secretário na entrevista, saudando os efeitos positivos da "nova matriz". Na época, a Selic sofrera um corte brusco e estava em 7,25%, mas em abril de 2013 começou a trajetória de reajustes e hoje está em 10%.
Inflação: na época, com a inflação longe do centro da meta e muito próxima de 6%, Márcio Holland partiu para um argumento absurdo para aquele momento: "Taxas de inflação muito baixas levam os BCs a juros muito baixos, que, por sua vez, geram bolhas de ativos", advertiu. O caso brasileiro era justamente o inverso. Diante da insistência do repórter em comparar com a média de 3% de inflação nos países emergentes, respondeu simplesmente: "Não dá para comparar". E previu que em 2013 a taxa voltaria ao centro da meta. Segundo projeções do boletim Focus, do BC, em 2013 vai fechar em 5,7% e, em 2014, em 5,92%. Portanto, mais longe do que perto do centro da meta (4,5%).
Investimentos: há um ano o secretário da Fazenda fazia forte aposta na expansão de investimentos de longo prazo - públicos e privados - em 2013, em decorrência dos estímulos do governo e da "nova matriz econômica". A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), que mede os investimentos, iria crescer 8% em 2013, o dobro do PIB. Segundo o IBGE, no terceiro trimestre de 2013, em comparação com igual período de 2012, a FBCF subiu 6,5%, mas caiu 2,2% em relação ao trimestre anterior. Por sua vez, o PIB está longe de confirmar a expansão de 4% prevista, devendo fechar próximo da metade, em 2013. Os leilões de privatização só engrenaram no final deste ano, ainda não viraram investimento efetivo e, na área estatal, Petrobrás e Eletrobrás não conseguem cumprir suas metas porque o governo encolhe suas tarifas e faturamento para conter a inflação.
Superávit primário: é onde mais aparece a discrepância entre promessa e realização. O governo passou o ano gastando além da conta e encolhendo a meta fiscal. Na entrevista, Holland prometeu superávit de 3,1% sem descontos. Na realidade, vai entregar 1/3 disso.
Cadê a "nova matriz"?
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