GAZETA DO POVO - PR - 20/11
Recursos não faltam. Situações como essas convivem com exemplos de gastos supérfluos, de desperdício e de desvios imensuráveis nos ralos da corrupção
“Em casa onde falta pão, todo mundo briga, mas ninguém tem razão.” O ditado é velho, mas ganha sentido ainda mais triste nestes dias que correm no Paraná diante da situação da Polícia Militar. Meses atrás, não havia pão nem margarina para alimentar os soldados antes de saírem às ruas para cuidar da segurança da população. Viaturas estavam retidas em oficinas mecânicas à espera de reparos porque não havia recursos para custeá-los. Agora, a Gazeta do Povo, em sua edição de segunda-feira, mostrou que também falta munição para a prática dos indispensáveis exercícios de tiro, forçando policiais a usar seus próprios recursos para manter a mira em forma.
São exemplos de que tem se ocupado a imprensa há meses e que afetam as polícias Militar e Civil, duas das mais importantes instituições às quais competem realizar tarefas indelegáveis do Estado, como a manutenção da segurança pública. Mas situações de penúria como as descritas afetam também outras áreas do serviço público, como as de saúde e educação, independentemente de administração municipal, estadual ou federal. Farmácias desfalcadas, postos sem médicos, escolas sem condições mínimas de abrigar alunos são fatos corriqueiros e de amplo conhecimento público.
Faltam recursos? Essa é uma das falácias que habitam o imaginário brasileiro e de que se valem os gestores públicos para justificar o não atendimento ou a precariedade dos serviços públicos. Não. Situações como as descritas costumam ser muito mais o resultado da incapacidade gerencial que da falta ou insuficiência de recursos – pois ao mesmo tempo multiplicam-se em escala gigantesca os exemplos de gastos supérfluos, de desperdício e de desvios imensuráveis nos ralos da corrupção.
A falta de munição nos quartéis cria um contraste com exageros inexplicáveis em gastos com combustíveis e alimentação por parte dos representantes do povo. Já em agosto deste ano, a Gazeta do Povo mostrava que, somente no primeiro semestre de 2013, os 54 deputados estaduais foram responsáveis por quase R$ 5 milhões em gastos de várias naturezas, mas 28% deles apenas em combustíveis. Com o R$ 1,2 milhão que deixaram nos postos de combustível, compra-se 436 mil litros de gasolina – o suficiente para um carro popular dar cem voltas em torno da Terra seguindo a linha do Equador, ou para ir 12 vezes à Lua. Em outubro, estourou o escândalo dos quase R$ 100 mil em gastos para abastecer a residência oficial do presidente do Senado, Renan Calheiros, com iguarias como camarão, filé mignon e bacalhau, pregão que só foi suspenso pela Casa após a divulgação pela imprensa.
São comuns os casos de superfaturamento ou de obras demoradas e que, ao fim, se mostram imprestáveis – sem falar em outros episódios emblemáticos de desapreço pelo dinheiro público, como o despejo de bilhões do BNDES (banco público abastecido com recursos diretos do Tesouro) nos sonhos megalomaníacos do falido empresário Eike Batista.
O Brasil, sexta maior potência econômica do mundo, e o Paraná, quinto maior PIB do país – ambos ricos em recursos oriundos do trabalho suado de cada um dos seus cidadãos, esmagados por escorchante carga tributária – sofrem historicamente do mesmo e crônico mal: o de não gerir com responsabilidade o dinheiro público, com planejamento exigente e definições precisas de prioridades.
É a população que paga por todas estas distorções no momento em que recolhe seus impostos; quando recebe os maus serviços públicos que lhe são prestados; e quando constata que está na má gestão dos recursos (e não na falta deles) a razão que nos faz patinar no atraso.
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