O Estado de S.Paulo - 11/10
A conversão ainda que tardia do governo Dilma às concessões dos serviços públicos não deixa de ser um fato positivo. Mas vai enfrentando problemas diversos com falta de traquejo, desconfianças, contradições internas e ameaça de descontinuidade.
A ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, que coordena os leilões de concessão de infraestrutura, reconhece que o governo paga o preço do aprendizado. Isso implica forte dose de tentativa e erro, que come prazos e exige consertos em quase todas as etapas de qualquer processo de licitação.
É enorme a lista de organismos e repartições do governo, cada uma com suas próprias burocracias, culturas, expectativas e tempos, que participam de cada processo desses. Apenas na área dos transportes rodoviários, por exemplo, há um rolo de siglas que envolvem Casa Civil, Ministério dos Transportes, Ministério da Fazenda, Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Tribunal de Contas da União (TCU), Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), o Ibama, que expede os certificados de licenciamento ambiental, e o sempre inevitável BNDES. "É um universo de caixas fechadas, onde ninguém conversa com ninguém e é preciso colocar todos em contato uns com os outros. Mas este não é um programa apenas de um governo; é um programa de Estado que tem de ser enfrentado", diz a ministra Gleisi.
O problema é que esse tipo de percepção de que é preciso dar capacidade de gestão à administração pública ainda parece raro em Brasília. O risco é o de que a dispersão e a falta de foco prevaleçam, até porque as eleições podem mudar muita coisa e a própria ministra Gleisi, por exemplo, prepara-se para candidatar-se ao governo do Estado do Paraná e terá de passar o bastão para quem fará o último trecho da corrida de obstáculos.
Todos esses projetos, por sua vez, pressupõem financiamento firme, num momento em que o Tesouro já é uma laranja espremida demais. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, vem batalhando para atrair os bancos privados nacionais para a cobertura desses projetos, numa paisagem em que quase não há capitais de longo prazo no Brasil e até mesmo os financiamentos habitacionais, que têm 15, 20, 30 anos para voltar em prestações mensais, são bancados pela caderneta de poupança, que é um crédito à vista do aplicador.
Além disso, os bancos privados enfrentam a concorrência do BNDES cujos créditos são subsidiados. É um jogo em que, para ter algum sucesso, parece exigir a contrapartida de compensação aos bancos, artifício que quase sempre produz outras distorções, além de não remover a que o originou.
E ainda é preciso lembrar que o clima de desconfianças recíprocas não está desfeito. O governo ainda acha que os empresários só querem moleza, enquanto os empresários estão convencidos de que o governo os vê como instituições de benemerência, sem fins lucrativos.
São obstáculos importantes que se ergueram ou se consolidaram nos últimos nove anos em que o governo federal descuidou da promoção de leilões de concessões públicas.
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