CORREIO BRAZILIENSE - 28/09
A política brasileira alcançou nos últimos dias sofisticação jamais antes experimentada. Sem contar com a possível criação da Rede Sustentabilidade, da ex-senadora Marina Silva, já são 32 legendas em pleno funcionamento, devidamente autorizadas pelo Tribunal Superior Eleitoral. As duas últimas foram o Partido Republicano da Ordem Social (Pros), cujo presidente é antigo vereador de Planaltina de Goiás, Eurípedes Júnior, e o Solidariedade, ligado ao presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva.
Partido, como o próprio nome indica, é uma fração do coletivo. Ou seja, determinado grupo de pessoas decide criar uma agremiação para defender esta ou aquela ideia. Na origem, partido é isso. Daí os partidos de esquerda, de direita e os favoráveis ao socialismo europeu. Eles defendem ideias ou projetos. Um exemplo: transporte público nos países europeus é estatizado. E dá prejuízo. Mas ninguém mexe nisso porque lá se entende que prover transporte público é dever do Estado.
Normalmente, as pessoas não gostam muito de falar no assunto, mas, nos Estados Unidos, o transporte público também é estatizado. No sentido de que pertence à municipalidade ou ao estado. Não existem empresas privadas carregando pessoas de um lado para o outro em Nova York, exceto os táxis. Os trens Amtrak são do Estado. Dão prejuízo, que é coberto por generosos subsídios. Mas, para que o norte-americano médio more nos subúrbios e trabalhe no centro das grandes cidades, é necessário haver transporte de qualidade e a preços baixos. Funciona.
Os partidos não se metem nisso. No Brasil, 32 partidos não defendem 32 ideias políticas diferentes, mesmo porque não existe no cardápio de ofertas da ciência política tamanha diversidade. Aqui há um diferencial: os partidos recebem a verba do governo para funcionar. O dinheiro depende do tamanho da bancada. E os tribunais eleitorais não consideram infidelidade partidária o deputado migrar de agremiação em pleno funcionamento para outra recém-inaugurada. Chovem, então, propostas. Há bom dinheiro em jogo no poder de atração. Será maior nas vésperas da eleição, quando o tempo de televisão constituirá moeda preciosa para compor as coligações partidárias.
A aprovação dos dois novos partidos políticos do Brasil abriu na Câmara a temporada de troca-troca de deputados entre as legendas. Houve quase uma feira de filiações. Pelo menos 46 deputados (9% da Casa) e um senador negociam ingressar no oposicionista Solidariedade e no Pros. As duas siglas promoveram reuniões em Brasília, cada uma com dezenas de deputados federais. Em alguns casos, como os dos deputados Marçal Filho (PMDB-MS) e José Humberto (PHS-MG), a filiação foi comemorada tanto por um quanto pelo outro partido.
É uma incógnita a posição final, definitiva e irrecorrível do TSE quanto à criação da Rede Sustentabilidade. Sua idealizadora, Marina Silva, aparece nas pesquisas de opinião com 25% das preferências dos eleitores brasileiros. Se for criado o novo partido, o 33° do universo político nacional, terá grande poder de atração. A força da gravidade vai fazer com que descontentes de todos os quadrantes encontrem refúgio na principal opositora de Dilma Rousseff, com evidentes chances de chegar ao segundo turno e vencer a disputa pela Presidência da República.
Paulo Pereira da Silva, idealizador do Solidariedade, deve apoiar Aécio Neves (PSDB) na campanha presidencial em 2014. O novíssimo Pros inclina-se em favor de Dilma. No final da semana, o Solidariedade anunciava a adesão de 25 deputados, com o objetivo de chegar a 35. O Pros contabilizava 15, mas pretende alcançar 30. O PDT vai perder pelo menos nove deputados e os demais partidos também terão perdas expressivas.
Política brasileira é assim. Autofágica. Ter 32 partidos não significa pluralidade de ideias. Indica apenas que a geleia geral aumentou e que o eleitor terá mais dificuldade para enxergar a realidade. A reforma partidária, tantas vezes prometida, ficou no meio do caminho. E ninguém mais se lembra que foi uma promessa importante depois das manifestações de junho.
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