O GLOBO - 28/09
Estava no Brasil até quinta-feira passada e fui testemunha ocular e auditiva do impacto provocado pela capa da revista “The Economist”: o Cristo Redentor entrando em parafuso depois da decolagem, metáfora do fracasso da economia brasileira. Em 2009, a mesma revista colocou na capa o Cristo em decolagem vertical...
Ah, leitor, é uma ilusão pensar que superamos o nosso clássico complexo de vira-lata. Ele está sempre presente, vigilante, à espreita. Ao menor pretexto, irrompe e mostra sua face tenebrosa. Com a capa da revista britânica, o referido complexo deu arrancos triunfais de cachorro atropelado, como diria Nelson Rodrigues. Fiquei observando, estarrecido. Do lábio de alguns brasileiros pendia a baba elástica e bovina da humildade.
Estou em Londres neste momento e interrompi a redação do artigo para ir comprar “The Economist”. Diferentemente do que informou a imprensa brasileira, o Brasil não é a matéria de capa — pelo menos não da edição que circula aqui.
Em todo o caso, é fato que a revista caprichou: traz 17 páginas sobre a economia brasileira onde predominam críticas e avaliações negativas — carga esmagadora para a nossa frágil autoconfiança.
Há motivos para críticas — e muitos. A economia está crescendo pouco, a inflação demora a ceder, o desequilíbrio das contas externas é crescente e preocupante. Mas o exagero da revista é manifesto. Não só agora, como também em 2009. A verdade é que a imprensa internacional é tão ciclotímica quanto os mercados financeiros. Até 2011, o Brasil era moda, referência, modelo. Em eventos internacionais, o brasileiro desfilava satisfeito, sob aplausos e encômios.
Elogio em inglês? Barbas de molho. Muito elogio do exterior é indicador antecedente de problemas — como mostra repetidamente a experiência latino-americana.
Na época, até avisei. Aqui mesmo nesta coluna, publiquei um artigo (“Elogios perigosos”, 6 de março de 2010) em que alertava que não estávamos com essa bola toda e destacava os problemas decorrentes da sobrevalorização do real.
Eis aí um aspecto que a revista britânica não destaca e mal menciona. O Brasil apresenta atualmente uma combinação de crescimento econômico baixo com desequilíbrio nas contas externas que é muito sintomática. Sintomática dos estragos provocados por um período demasiado longo de valorização cambial.
A moeda forte enfraqueceu a economia. Minou a capacidade de competição das exportações, estimulou a substituição de produção nacional por importações, solapou o setor industrial, transformou o superávit comercial em déficit e vem levando a um aumento perigoso do déficit do balanço de pagamentos em conta-corrente.
Vamos ter que correr atrás do prejuízo.
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