quinta-feira, setembro 26, 2013

Discurso eleitoreiro - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 26/09
O discurso da presidente Dilma Rousseff na abertura da 68ª Assembleia Geral das Nações Unidas pode ter o efeito de insuflar os ânimos da militância petista para a campanha sucessória de 2014. No mais, a bravata contra a espionagem dos Estados Unidos - de que ela própria foi vítima, além de cidadãos e empresas do Brasil, incluindo a Petrobras - foi tão inócua quanto a proposta que apresentou, de aprovação, pela ONU, de um marco internacional para restringir a arapongagem, em nome da soberania das nações.
A contundência da fala presidencial ganhou espaço nobre nos principais jornais do mundo, com chamadas de primeira página destacando a inconformidade que Dilma já demonstrara ao suspender viagem de Estado a Washington, antes prevista para o próximo mês. No mais, não ecoou nem sequer no pronunciamento de Barack Obama, que subiu à tribuna logo depois dela e, de costas para a América Latina, desviou por completo o rumo da prosa, tratando de questões relativas ao Oriente Médio e ao norte da África.

Dilma bem sabe que a invasão de privacidade pelos Estados Unidos não se deu por falta de regulamentação. Primeiro, ao menos hoje é impensável a imposição de regras capazes de controlar a internet. Segundo, foi à revelia da ONU, portanto, acima das convenções internacionais, que os EUA promoveram a ofensiva militar contra o Iraque, 10 anos atrás. Terceiro, espionagem é atividade periférica, que não segue ritos preestabelecidos.

Resposta mais eficaz seria o Estado brasileiro cuidar da defesa cibernética. Mas, nesse aspecto, faltou fazer o dever de casa. E a oposição não deixou barato. "Menos de 10% do orçamento para o setor neste ano foram utilizados, o que demonstra que, apesar do tom grave adotado na ONU, a presidente da República e seu governo não deram, até aqui, nenhuma importância a essa questão", declarou o pré-candidato tucano à Presidência da República, o senador Aécio Neves.

Nesse contexto, faltam contra-argumentos à crítica de que a fala presidencial na Assembleia das Nações Unidas teve caráter eleitoreiro - ainda que se concorde com Dilma em que a espionagem foi "caso grave de violação dos direitos humanos e das liberdades civis"; que "sem o direito à privacidade não há verdadeira liberdade de expressão e de opinião, e, portanto, não há efetiva democracia"; e que "sem respeito à soberania, não há base para o relacionamento entre as nações".

A reforçar a tese do tom de campanha, destaque-se a autopromoção da presidente ao lembrar a luta pela redemocratização do país "contra o arbítrio e a censura". Aliás, salvo breves referências a assuntos internacionais - como o repúdio ao atentado terrorista no Quênia e o apelo a uma saída diplomática para a crise na Síria -, a presidente também dedicou-se a enaltecer a própria política de governo, como o combate à pobreza, à fome e às desigualdades. Sobrou tempo até para falar dos cinco pactos propostos por ela em resposta aos protestos que tomaram as ruas em junho. Só não disse que a corrupção segue produzindo escândalos; a mobilidade urbana, a educação e a saúde, em falta; e os impostos, nas alturas.

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