O GLOBO - 24/08
O governo instituiu uma política para gasolina e óleo diesel, com critérios ignorados, que faz a Petrobras perder receita e asfixia a indústria do etanol
A acentuada depreciação do real frente ao dólar agravou ainda mais um problema criado pelo governo: a defasagem dos preços dos combustíveis.
Logo após a abertura do mercado brasileiro de petróleo e gás, para estimular investimentos nos diferentes segmentos do setor, as autoridades instituíram uma regra de ajuste nos preços dos combustíveis que buscava acompanhar as cotações internacionais. Embora continuasse tendo um monopólio de fato no refino, esperava-se que os preços fossem limitados por essa regra. Quando estivessem muito altos, as importações de combustíveis seriam estimuladas, derrubando os preços internamente. E se, ao contrário, os preços aqui ficassem muito abaixo das cotações do mercado internacional, poderiam despertar o interesse pela exportação.
Na prática, isso não chegou a acontecer, pois a infraestrutura para embarque ou desembarque de combustíveis também permaneceu em poder da Petrobras, e forçosamente importações e exportações dos principais derivados do petróleo têm de passar por dutos ou terminais marítimos da estatal, que não estão disponíveis para concorrentes (a não ser que se comprove ociosidade).
Com isso, os preços da gasolina e do óleo diesel deixaram de ser ajustados pela nova regra e a decisão hoje cabe ao governo, por critérios ignorados. Tal política, além de causar sérias distorções no mercado doméstico de combustíveis, tem prejudicado inclusive a Petrobras, com enorme perda de receita. Para tapar o sol com a peneira, o governo também abriu mão de tributos incidentes sobre a gasolina e o diesel (a Cide).
E para piorar o quadro, essa política vem asfixiando o etanol, até então a mais bem-sucedida experiência mundial, na área de transportes, de substituição de derivados de petróleo por uma fonte renovável de energia.
O álcool carburante hidratado somente é competitivo quando seus preços correspondem a menos de 70% do que o consumidor paga pela gasolina. Os produtores de etanol não têm conseguido ampliar a produção de álcool hidratado nos atuais patamares de preço, o que obriga a Petrobras a importar mais gasolina, aumentando suas perdas de receita. A indústria somente não sucumbiu porque produz açúcar e álcool anidro, cujo mercado é assegurado no país pela mistura obrigatória à gasolina, na proporção de 25%.
Para atender a objetivos de curto prazo, sob temor que a inflação escape ao controle (em grande parte por responsabilidade da política econômica, os índices têm se mantido perigosamente próximos ao teto da meta que o próprio governo fixou, de 6,5%), o artificialismo que vem prevalecendo no mercado brasileiro de combustíveis vai contribuindo para desmontar toda uma cadeia produtiva, que começa na agricultura e se estende pela indústria.
O efeito desta política é devastador: pelo lado do caixa da Petrobras e no desincentivo de um combustível de fonte renovável e pouco poluente.
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