O GLOBO - 03/08
Subsídios pouco explícitos e o uso da “contabilidade criativa” jogam problemas para o futuro, quando cairão como tempestade sobre o governo de então
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, tratou de desmentir com rapidez a notícia, de “O Estado de S.Paulo”, de que a presidente Dilma resolvera retirar do limite de endividamento de estados e municípios os projetos destinados a melhorar o transporte público. E já teria pedido ao advogado-geral da União, Luiz Adams, proposta de mudanças na Lei de Responsabilidade Fiscal com este objetivo.
No desmentido, Mantega garantiu, ainda, que há espaço, dentro dos limites da LRF, para a contratação de novos projetos de mais de R$ 100 bilhões. O ministro é contra, pois sabe que a lei é o único dique que contém as pressões constantes por mais gastos. E um dique já com fissuras.
Mas sabe-se que esta não é posição unânime no governo Dilma. Vale lembrar que o PT, na oposição, foi feroz adversário da Lei de Responsabilidade, só mantida intacta no governo Lula porque o candidato petista assinou documento, na campanha eleitoral de 2002, se comprometendo a não cometer heterodoxias na política econômica.
Apesar do desmentido oficial, o governo deseja incluir na proposta da Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2014 a possibilidade de estados e municípios deduzirem investimentos de seu resultado fiscal, para efeito do cálculo do superávit primário. Como já faz a União à larga.
A cada artifício desses, cada operação de “contabilidade criativa”, sempre com o objetivo de passar a imagem de uma austeridade fiscal que não existe na realidade, reduz-se a transparência na contabilidade pública e a confiança dos investidores. Este ponto fraco brasileiro já está na mira das agências de avaliação de risco.
Preocupa que o país volte a cometer erros já vistos. A distribuição de subsídios, nem sempre de maneira clara, já produziu muitos “esqueletos” fiscais que, tão logo a economia foi estabilizada, saíram do armário para assustar equipes econômicas. Um exemplo, hoje histórico, é o do Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS), criado em 1967 para saldar o desencontro entre o que havia sido pago pelo mutuário do sistema financeiro da habitação e o saldo devedor do empréstimo. O BNH acabou, mas o FCVS virou um “esqueleto”, resgatado depois do Plano Real.
O governo Dilma tem usado na conta de luz o perigoso instrumento do subsídio bancado pelo Tesouro, depois do corte draconiano de 20% na receita operacional do setor elétrico. O mesmo ocorre nos bilhões levantados por meio de endividamento público a uma determinada taxa de juros, para repassá-los ao BNDES, que os empresta a um custo menor. A diferença é espetada de volta no Tesouro. O mais simples e menos obscuro dos subsídios é o dos combustíveis, responsável pelo desestímulo ao álcool e problemas financeiros da Petrobras.
Já existe, enfim, um emaranhado de operações e várias decisões que empurram problemas para o futuro. Hoje, eles reduzem a credibilidade da política econômica e, amanhã, desabarão como tempestade sobre o governo de então.
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