O Estado de S.Paulo - 06/08
Investir pesadamente em rodovias, ferrovias, portos, aeroportos e outros projetos de infraestrutura é indispensável para a economia voltar a crescer de forma consistente, mas o governo continua com dificuldade para executar o programa de obras lançado em agosto do ano passado. Para garantir a realização desses investimentos, o governo precisará envolver o setor privado, por meio de concessões e de parcerias. Isso dependerá, no entanto, de uma revisão dos critérios anunciados até agora, especialmente da taxa interna de retorno oferecida aos participantes. Diante da resistência dos investidores, a administração federal agora se dispõe a rever a modelagem das concessões, segundo noticiou o Estado nas edições de sábado e domingo. Foi, em muito tempo, a primeira informação positiva sobre o assunto. Depois de perder quase um ano, as autoridades parecem dispostas a cuidar do plano com um pouco mais de realismo.
Empresários mostraram ao governo seu descontentamento em relação às regras previstas para os contratos. As taxas internas de retorno, 7,2% para os investimentos em rodovias e entre 7,5% e 8,5% para os empreendimentos ferroviários, têm sido avaliadas por possíveis investidores como insuficientes para compensar os riscos. Para os terminais portuários, fontes do governo indicam taxas prováveis entre 7% e 7,5%, também qualificadas como insuficientes.
Oficialmente, ministros e outros altos funcionários continuam apostando no sucesso das licitações, mas a confiança manifestada em conversas reservadas é bem menor. Já receberam demonstrações de insatisfação mais que suficientes para convencê-los a levar a sério as críticas do setor privado. Além da remuneração prevista para o capital investido, fontes empresariais criticam também as estimativas de custos. Exemplo: para o primeiro trecho ferroviário a ser leiloado - entre Açailândia, no Maranhão, e o porto paraense de Vila do Conde - foram estimados oficialmente investimentos de R$ 3,1 bilhões. Mas dificilmente o custo será inferior a R$ 4,5 bilhões, pelos cálculos privados.
Segundo a reportagem, o diretor da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Carlos Fernando do Nascimento, defendeu o cálculo fixado para o trecho Açailândia-Vila do Conde. Os valores, argumentou, foram discutidos com o Tribunal de Contas da União (TCU). Pode ser, mas a prova final, se os representantes do governo mantiverem sua opinião, ainda vai depender de um ou dois testes. O primeiro será a licitação. O segundo, se ocorrer, será a repetição de um ritual bem conhecido no Brasil. Se, apesar de tudo, algum grupo se dispuser a realizar a obra, restará verificar o ritmo de execução e as revisões contratuais para a elevação de valores.
Sem um choque de realismo, dificilmente a administração federal conseguirá destravar o Programa de Investimentos em Logística. Só a parte de rodovias e ferrovias foi estimada em R$ 79,5 bilhões para os primeiros cinco anos. Outros R$ 53,5 bilhões estão previstos para outros 20 a 25 anos. Segundo o presidente da Empresa de Planejamento e Logística (EPL), Bernardo Figueiredo, todos os editais de concessão devem ser publicados neste ano. Em média, disse ele, as licitações deverão ocorrer 60 dias depois do lançamento dos editais.
O irrealismo no tratamento de concessões e parcerias tem caracterizado principalmente a administração federal, mas erros semelhantes podem ocorrer em outros níveis. O governo de São Paulo terá de relançar a concorrência para a construção e operação da Linha 6-Laranja do Metrô, entre Vila Brasilândia, na zona norte, e a Estação São Joaquim, na Liberdade.
Nenhuma empresa se apresentou para disputar a obra, estimada em cerca de R$ 8 bilhões e considerada a maior parceria público-privada do País. Segundo o governador Geraldo Alckmin, alguns interessados manifestaram dúvidas, especialmente sobre financiamentos e custos das desapropriações.
Descuido e irrealismo custam tempo. Tempo perdido é um dos grandes fatores de encarecimento de obras públicas.
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