quarta-feira, junho 26, 2013

Confusão constituída - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 26/06

Dilma turva o debate com proposta extemporânea de constituinte exclusiva; plebiscito pode desatar o nó da reforma política, contudo


Pressionada pelas grandes manifestações que tomaram as ruas das principais cidades do país, a presidente Dilma Rousseff (PT) sentiu-se, com razão, obrigada a dar alguma resposta às demandas.

Até que começou bem, com um pronunciamento firme e sereno na TV. Logo se desencaminhou, porém, na reunião com governadores e prefeitos, ao detalhar compromissos vagos em propostas mais específicas --uma salva de fogos de artifício, que produziu mais estrondo do que luz, além do constrangedor recuo da presidente menos de 24 horas depois.

Afora previsíveis e duvidosos projetos sobre austeridade, transportes, educação e saúde, Dilma lançou duas ideias mirabolantes: a convocação, por plebiscito, de uma constituinte exclusiva para a reforma política e a inclusão da corrupção entre os crimes hediondos, tornando-a inafiançável, com pena inicialmente em regime fechado e progressão dificultada.

A proposta sobre crimes de corrupção é mais uma a banalizar um recurso superlativo antes na aparência do que na realidade. Como a indignação manifestada nas ruas corre o risco de fazê-la passar por solução, cabe repisar o argumento: aumentar a severidade das punições não produzirá o que de fato está em falta no país --o rápido e inteiro cumprimento das leis já existentes.

Pior foi a manobra diversionista da constituinte. É óbvio que a presidente pretendeu com ela transferir a responsabilidade para o Congresso, que teria o ônus de organizar a amputação de seus próprios poderes reformadores (cabe lembrar que 73 emendas constitucionais foram aprovadas desde 1988).

Boa parte da legislação partidária que se pretende reformar nem necessitaria de mudanças na Constituição. O realismo e o retrospecto políticos indicam que o Congresso não se dispõe a encetar tal reforma; diante do impasse, ganha força a proposta de recorrer a uma consulta popular, mas sem a aventura de uma constituinte exclusiva.

Pode ser essa a saída para romper o nó górdio. Mas não será trivial definir os detalhes e realizar até outubro --a tempo de valer já na eleição de 2014-- um plebiscito para decidir o que há anos se discute e nunca se resolve. Para dar certo, a consulta teria de ser muito concisa e precisa.

Esta Folha defende que os costumes políticos brasileiros teriam uma chance boa de melhorar se o país se decidisse pelo voto distrital misto (para estreitar o vínculo do cidadão com seu representante eleito), pela cláusula de barreira (para diminuir o número de partidos e aumentar sua representatividade), pela manutenção do financiamento privado (mas com regras claras sobre valores e transparência) e pelo fim das coligações em eleições para deputados e vereadores (meramente eleitoreiras).

A balbúrdia criada por Dilma Rousseff, infelizmente, em nada contribui para que o país venha a dar esses passos que aperfeiçoariam sua democracia.


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