O GLOBO - 20/04
Os argentinos fizeram, na noite de quinta-feira, o maior protesto contra o governo Cristina Kirchner. Centenas de milhares se manifestaram em Buenos Aires e outras cidades do país com o típico bater de panelas, ocacerolazo. É o terceiro evento desse tipo em pouco mais de sete meses — os outros ocorreram em setembro e novembro do ano passado.
O foco do último protesto foi a reforma judiciária que o kirchnerismo faz aprovar, a toque de caixa, no Congresso, onde tem maioria. Mas também estiveram presentes outros aspectos da vida argentina que causam imenso desgaste ao governo K, como a inflação, a violência nas ruas, a corrupção e o projeto de emendar a Constituição para permitir um terceiro mandato a Cristina.
A reforma judiciária impulsionada pela Casa Rosada, sob o argumento de “democratizar” a Justiça, foi alvo de intensa crítica da maioria dos setores nacionais e da oposição, que nela veem uma tentativa de ampliar o controle do Executivo sobre as outras instituições do Estado. O projeto adota a eleição direta para o Conselho da Magistratura, o que se refletirá na politização das decisões. Impõe, também, um limite de seis meses para a vigência de liminares, o que, inclusive, já passou no Congresso.
A mobilização kirchnerista decorre do fato de a Justiça ter travado dispositivos da autoritária cLei de Meios, criada sob o argumento de “desconcentrar” os grupos de mídia, mas claramente visando a esfacelar o Grupo Clarín, crítico do governo. Outras empresas, como a que edita o jornal “La Nación”, são também alvos da iniciativa. Enfureceu a Casa Rosada a recente decisão da Câmara Federal Civil e Comercial de considerar inconstitucionais dois artigos da Lei de Meios que atingem mais duramente o “Clarín”.
O protesto de quinta-feira mostra que a sociedade argentina reage para conter o avanço kirchnerista. As decisões da Justiça evidenciam que pelo menos um dos poderes da República não se rendeu ao autoritarismo do governo K. A reforma proposta pela Casa Rosada é mais um caso de aplicação na Argentina do “kit chavista”, que submete as instituições a um Executivo forte e a um chefe de Estado capaz de criar regras para se eternizar no poder.
A progressiva “chavização“ do país se dá ao mesmo tempo em que o movimento, contrário ao ideário democrático, entra em crise no nascedouro, a Venezuela, com a morte de Chávez e a inexpressiva vitória eleitoral de seu discípulo, Nicolás Maduro, sobre Henrique Capriles, símbolo da oposição cada vez mais forte ao autoritarismo de Estado. Na Argentina, a sociedade e algumas instituições tentam resistir à avalanche kirchnerista.
Mas como numa democracia o poder deve ser obtido nas urnas, a oposição argentina precisa unir-se em torno de um projeto viável que atraia os eleitores descontentes, a maioria.
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