CORREIO BRAZILIENSE - 22/12
Há uma coerência quase insuportável nos movimentos de Joaquim Barbosa. E isso não está apenas no fato de o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) ter negado ontem o pedido de prisão dos mensaleiros. Um pedido, é preciso lembrar, feito pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que considerava necessária a urgência da prisão. Na cabeça do chefe do Ministério Público não era preciso uma instância revisora do processo, afinal todos os camaradas haviam sido condenados pela maioria do plenário da mais alta Corte.
Se eles foram considerados culpados, por que adiar ainda mais a cadeia? Mas, ao rejeitar o xilindró imediato para os condenados da Ação Penal 470, Barbosa seguiu parâmetros e jurisprudências, o que por si só já confirmaria a tal coerência. E vamos ao juridiquês, pois. Para o ministro, o plenário do STF, em outra decisão, considerou ser “incabível o início da execução penal antes do trânsito em julgado de condenação, ainda que exauridos o primeiro e o segundo graus de jurisdição”. Barbosa disse ainda que não existe algo urgente para mandar os mensaleiros para a prisão. Tratava, evidentemente, de uma possível fuga dos condenados, o que seria improvável por causa da retenção dos passaportes. A decisão de Barbosa, entretanto, não é a única coerência em jogo.
A segunda delas, talvez a mais simbólica para parte dos lulapetistas e da oposição, está no fato de o ministro fazer algo ou declarar alguma coisa contrária à expectativa geral. A aceitação do pedido de prisão era dada como certa para quem achava que Barbosa foi duro ao preparar o relatório contra os mensaleiros. Ou até mesmo para quem torce contra o PT em todos os momentos — rejeitando inclusive ganhos politicos e sociais do governo Lula — e encarava a prisão dos condenados como certa. Rezavam para ver José Dirceu passar o Natal na cadeia.
Voto aberto
Pois bem, contrariando todos os homens de partido, Barbosa mostrou-se apartidário. Não foi a primeira vez. O ministro do STF fez o mesmo — ou seja, deu um nó na cabeça dos políticos — quando disse, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo no último mês de outubro, ter votado em Luiz Inácio Lula da Silva em 2002 e 2006. Na época do voto ele já era relator do processo no Supremo. Se a declaração deixou os lulopetistas perdidos, trouxe a desconfiança da oposição sobre o resultado da julgamento. O processo chegou ao fim. No meio, agora em outubro, uma eleição municipal nada ou pouco influenciada pelo mensalão.
Ontem, ao negar o pedido de prisão dos condenados, o presidente do Supremo mostrou que mais uma vez que a expectativa de partidos passou longe de resultados jurídicos. No mais, Barbosa mostrou prudência ao não tomar a decisão monocraticamente e assim esperar a volta dos demais ministros do recesso para decidir sobre a prisão. Se isso levará os condenados a ganhar mais tempo e até ter alguma esperança de escapar da cadeia, é outra coisa. Tão séria quanto a decisão de Barbosa em negar a prisão de imediato.
Outra coisa
Combates sempre são travados para a plateia. Sem ela, nada tem graça, afinal de contas há poucas coisas nessa vida mais chatas do que ouvir alguém a contar as glórias, tendo o interlocutor nunca presenciado os feitos do narrador. Ou pior, ficar com a versão final do vencedor, como nos vários episódios da história mundial. O embate entre Congresso e Supremo é público. Mas isso não o torna melhor. De um lado, o do Legislativo, há um grave problema: a falta de um ator capaz de argumentar sem parecer fisiológico.
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