FOLHA DE SP - 15/10
RIO DE JANEIRO - Leitores de biografias às vezes se espantam com a quantidade de informações contidas nelas e vêm me dizer: "Mas que pesquisa, hein?". A intenção é boa e a admiração, sincera, mas a palavra não faz jus ao trabalho de um biógrafo. Ou de alguns biógrafos.
"Pesquisa" costuma significar um mergulho em coleções públicas ou particulares contendo recortes, documentos, manuscritos, ou seja, material previamente escrito ou impresso. Se a função do biógrafo fosse de apenas coligir esse material, ele seria um enviado especial ao arquivo, e seu livro, um reles requentado de textos alheios. Na prática, a consulta a esse material é apenas o primeiro passo do trabalho, e do qual ele não representa mais que 20%. A papelada reunida pelo biógrafo só serve para orientá-lo na escalação do elenco de fontes que ele deverá procurar -e delas colher informações de primeira mão.
Uma biografia que se pretenda abrangente não ouvirá menos de 150 a 200 pessoas, algumas das quais várias vezes. Como essas fontes não são identificáveis de saída (muitos nomes só aparecem à medida que o trabalho avança) e podem levar anos para se achar e marcar um encontro, essa fase -que toma pelo menos 50% do tempo necessário para se produzir uma biografia- ficaria melhor se chamada de investigação. A sola do sapato é uma medida realista do esforço.
Alguns críticos, indiferentes à faina exigida para se levantar a vida de alguém, preferem dizer que esse levantamento é comprometido pela visão do biógrafo, manchado pelas visões conflitantes de um mesmo fato, inevitavelmente incompleto ou simplesmente impossível. Enfim, que a biografia é ficção ou fraude.
O biógrafo, ao ler isto, apenas enxuga o suor da testa e sai para conversar com mais uma fonte que ele levou um ano para localizar num remoto subúrbio.
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