sexta-feira, outubro 26, 2012
Oportunidade de moralização do fundo partidário - EDITORIAL O GLOBO
O Globo - 26/10
Na superficial e distorcida polêmica sobre o "financiamento público de campanha", vende-se a ideia de que, se o contribuinte bancar todos os gastos de partidos e políticos, a corrupção será varrida das eleições, e fica subentendido o equívoco de que não existe ou é pouco o dinheiro do Tesouro na política. Na verdade, a cifra é elevada e o fato de haver recursos do Tesouro no circuito partidário está longe de ser garantia de lisura - costuma, até mesmo, ser o contrário.
Neste sentido, é lapidar o caso de indícios de desvios de dinheiro do fundo partidário revelado pela "Folha de S.Paulo", com o envolvimento de 17 partidos. A história começa com a descoberta de irregularidades na prestação de contas referentes ao período de 2000 a 2005 apresentada à Justiça eleitoral pelo PP. Constatados os indícios de desvios, a presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministra Cármen Lúcia, do Supremo, determinou investigações de processos também de outros partidos. Entre eles, PDT, PTB, PSB, PMDB, DEM e PSDB. A Polícia Federal foi chamada, para apurar a atuação do ex-coordenador de exame de contas do TSE Wladimir Azevedo Caetano, lotado agora no Conselho Nacional de Justiça. Auditoria interna do TSE descobriu que Caetano retirava processos de prestação de contas das mãos de subordinados e os aprovava sem restrições. Há cheiro forte, portanto, de corrupção.
Destinação de recursos para fins não relacionados à vida partidária, pagamentos em espécie a pessoas não identificadas, uso de notas frias foram maneiras encontradas de se desviar dinheiro do fundo partidário. No PP, o desfalque ultrapassaria os R$ 20 milhões.
O fundo partidário é cobiçado. Abastecido por dinheiro da União e de penalidades estabelecidas pelo TSE, ele terá distribuído este ano R$ 324 milhões. Entende-se a cobiça. Supõe-se que o fundo justifica a existência de muito partido nanico, cujos dirigentes dependem de suas transferências compulsórias. Por ser muito frouxa a legislação que regula a vida das legendas, das cerca de três dezenas de partidos existentes no país parte vive atracada à teta do fundo partidário - e das negociações do tempo de TV, entre outras transações subterrâneas.
Espera-se que as investigações abertas pela ministra Cármen Lúcia reforcem o processo de moralização da política, de que faz parte a aprovação da Lei da Ficha Limpa, com o reforço da condenação histórica de mensaleiros pelo Supremo Tribunal. Os desfalques dados no fundo partidário precisam gerar efeitos para além da comprovação de que o "financiamento público" não é garantia de eleições sérias e partidos éticos. Métodos na liberação dos recursos e prestação de contas têm de ser revistos, aprimorados. É necessária transparência no tráfego de dinheiro no mundo político. E a punição dos "contas-sujas", políticos em dívida com a Justiça, precisa voltar à agenda. É com base em situações concretas como esta que se aperfeiçoam leis e instituições.
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