O Estado de S.Paulo - 11/10
A autocrítica não é da personalidade petista. Não que não existam defensores da utilidade do exame de consciência no partido: de memória cito Tarso Genro, José Eduardo Cardozo e Aloizio Mercadante.
Este último, ainda no início do primeiro governo Lula, recomendava uma revisão de procedimentos em relação às reformas do governo anterior que o PT tanto combateu e depois acolheu. Aconselhava que o partido reconhecesse o equívoco e explicasse à sociedade as razões da nova posição.
Na época, José Dirceu abordava o tema de outra forma: o novo governo simplesmente não devia satisfação a respeito. Disse isso quando perguntado em entrevista ao Estado se não era incoerente o PT atacar e depois defender a reforma da Previdência.
No quente do escândalo do mensalão, Genro e Cardozo reclamaram a necessidade de um urgente inventário. Os dois propuseram uma reflexão seguida de reformulação interna, inclusive com a edição de novo código de ética para balizar a conduta de filiados ao molde do que antigamente cantava a musa no partido.
Falaram sozinhos. Passado o susto, vencida a perplexidade inicial, construído o muro de arrimo na tese do caixa 2, o PT se escorou na força de Lula, na incerteza da sociedade de que princípios deveriam valer também para a política, e tocou o barco.
Sem a mesma aura, já com uma legião de decepcionados, mas com vigor suficiente para ganhar duas eleições presidenciais.
Agora ensaia de novo reação, não obstante as evidências prescrevam como mais prudente uma pausa para meditação, uma resolução dos passivos, a fim de não solapar o enorme capital que ainda lhe resta.
Pela simples razão de que as condições objetivas agora são desfavoráveis. Vejamos alguns exemplos.
A adversidade não resulta de luta política, mas de condenação judicial em instância suprema depois de cinco anos de processo, assegurado amplo direito de defesa.
O julgamento terá efeito em decisões judiciais daqui em diante, além de inibir ações baseadas na certeza absoluta da impunidade.
O uso do caixa 2, antes aceito como inevitável, depois de ter sido tratada pelo STF como prática criminosa não serve mais como desculpa.
Lula não fala mais da tribuna presidencial. Os aliados de hoje não têm a mesma referência de ontem e, amanhã, querem ver a fila do poder andar.
Enfim, o mar não está para peixe como já esteve.
José Dirceu exorta o partido a dobrar a aposta: concentrar-se na luta eleitoral e vencer em São Paulo. Ou seja, a lógica de sempre, o "vamos que vamos" que deu no que deu.
Tal visão menospreza a essência do que se passa: sim, o PT ganha a Prefeitura de São Paulo, mas de que isso serve para a reconstrução da confiabilidade do partido?
Vários políticos foram reeleitos depois de envolvidos em escândalos e, no entanto, voltaram sem o prestígio de antes. Muitos o perderam para sempre. Outros vêm perdendo gradativamente.
Dirceu terá dificuldade, para dizer o mínimo, de manter a influência no PT devido à contingência de precisar sair por algum tempo de circulação.
A despeito da presumível romaria de jornalistas que continuarão a procurá-lo para dar opinião, a cadeia, convenhamos, não é o espaço mais confortável para o exercício de liderança partidária.
José Dirceu pode até fazer barulho para tentar motivar a militância. Mas não pode fugir do fato de que é um homem vencido.
Desmentido. O Supremo não demorou dois meses para contrariar as expectativas de descrença na eficácia da Justiça.
Pesquisa do Datafolha de agosto indicava que 73% das pessoas achavam que os crimes deveriam resultar em castigo.
Apenas 11% acreditavam que os réus seriam punidos, 37% apostavam em condenações sem prisões e 43% cravaram a alternativa da absolvição.
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