sábado, setembro 08, 2012
O caso Fox - HÉLIO SCHWARTSMAN
FOLHA DE SP - 08/09
SÃO PAULO - Meu colega João Pereira Coutinho publicou na terça uma interessante coluna em que criticava o estilo tortuoso de muitos textos das ciências humanas. Como estou convencido de que mesmo ideias sutis podem ser expostas de forma clara, concordo com Coutinho em gênero, número e caso.
Receio, contudo, que ele tenha sido levemente injusto para com as humanidades. Não há dúvida de que elas abusam do jargão e da impenetrabilidade. Prova-o um célebre caso de 1996, em que o físico Alan Sokal, disposto a demonstrar a falta de rigor das ciências humanas, submeteu à revista "Social Text" um artigo-embuste que foi aceito e publicado. O texto era uma coleção de disparates em linguagem empolada, argumentando que a gravidade quântica é uma construção social e linguística. Diga-se em favor da "Social Text" que, à época, ela não contava com sistema de revisão por pares.
O problema é que esse tipo de coisa não é exclusividade das ciências humanas. Num experimento mais antigo e menos famoso, pesquisadores da Universidade da Califórnia criaram o Dr. Myron L. Fox.
Também era um engodo. Não existia nenhum Dr. Fox. Para representá-lo, contrataram um ator, Michael Fox, que deu uma aula sobre teoria dos jogos aplicada à educação médica. A exposição não tinha amparo na lógica. Eram frases de duplo sentido sobrepostas a contradições e palavras difíceis. Mas o ator tinha charme e dizia as bobagens com autoridade.
A plateia, composta por psiquiatras e psicólogos, não percebeu o logro. Na verdade, avaliou o desempenho do Dr. Fox muito positivamente. Vídeos da aula foram exibidos a outros públicos sempre com os mesmos níveis de sucesso.
Hoje, o caso Fox é usado em livros de psicologia para ilustrar as várias formas pelas quais nossos cérebros se deixam seduzir por elementos não racionais. O problema, no fundo, é a arquitetura de nossas mentes.
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