SÃO PAULO - Com a entrada da Rússia na Organização Mundial do Comércio, a entidade passou a englobar todas as potências do planeta. É verdade que, devido ao fracasso da Rodada Doha, a organização não anda em alta, mas há razões para celebrar a adesão do país eslavo.
Embora nós nem sempre nos demos conta, o comércio foi, e provavelmente ainda é, uma das principais forças de manutenção da paz mundial. Como explica Steven Pinker em "The Better Angels of Our Nature", durante a maior parte da história da humanidade as circunstâncias econômicas impunham uma lógica pela qual quase sempre valia a pena massacrar povos vizinhos. Eles não apenas não traziam nenhum benefício ao meu grupo como representavam uma ameaça, ainda que tênue. Assim como nós cogitávamos atacá-los preventivamente, eles teciam considerações semelhantes em relação a nós. Mesmo que não tivéssemos grande antipatia uns pelos outros, estávamos presos a essa armadilha imposta pela teoria dos jogos.
A entrada em cena do comércio muda a lógica das coisas: saímos de um jogo de soma zero para entrarmos num de soma positiva. Os incentivos à violência se alteram. Com a possibilidade do comércio, meus vizinhos se tornam, pela primeira vez, mais valiosos vivos do que mortos.
O interessante nesse mecanismo é que ele esconde uma inversão de valores. A esquerda de um modo geral, seguindo os passos de pensadores religiosos como santo Agostinho e são Jerônimo, costuma imprecar contra o egoísmo e a ganância do capitalismo, mas, quando vamos à teoria dos jogos, verificamos que o mercado, na verdade, constitui um estímulo à empatia -provavelmente maior que o das religiões. O homem de negócios precisa tratar bem seus clientes, ou os perderá. E quanto mais fregueses atrair, mais rico ficará. É o que o economista Samuel Ricard, no início do século 18, chamou de "gentil comércio".
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