À saída do camarim, Vladimir Brichta não consegue dar mais que dois passos. Mal abraça a autora Maria Adelaide Amaral, que faz questão de lhe cumprimentar antes de deixar o teatro Renaissance, em São Paulo, já vê câmeras e gravadores apontados para sua cara. De longe, avista uma prima. "Ô, gente, meus parentes estão ali, deixa eu só dar um beijo neles", pede, sem sucesso.
É noite da estreia de "Arte", peça encenada e produzida pelo ator. Começa o bombardeio de indagações: "Qual a mensagem da peça?", "Você está assim sempre de bom humor?". Uma fã, Anunciada César, diretora de escola em Pernambuco, se aproxima da repórter Lígia Mesquita. "Moça, pergunta se a Carminha vai continuar má até o fim da novela."
Não precisou. Um segundo depois o tema é introduzido por um repórter: "Como está se sentindo com o sucesso da Carminha? Como ela vai acabar?". "Sou suspeito. A Adriana está incrível!"
Desde que a novela "Avenida Brasil" (Globo) começou, em março, o ator, que vive Armane no seriado global "Tapas & Beijos", virou o "marido da Carminha". A vilã do ano na TV é interpretada por sua mulher, a atriz Adriana Esteves. "Seria surpreendente se, numa festa da novela, perguntassem pra ela da minha peça", ri. "Não me chateia ser abordado para ouvir elogios a ela; tenho orgulho. O trabalho dela é assombroso e a novela é o assunto do momento, mais comentada que o mensalão."
Mas tudo tem um limite, avisa o mineiro de 36 anos crescido em Salvador. "Na estreia da peça no Rio, dei uma longa entrevista, posei pra fotos. A Adriana foi e a fotografaram. A reportagem saiu com a foto dela, dizendo assim 'Carminha vai ver o marido'. E era tudo em cima disso. O marido da Carminha é o Tufão", afirma.
"Tô com frio", diz, de camisa polo azul e jeans, enquanto pega uma malha. É véspera da estreia e o ator conversa com a coluna no teatro, antes de ensaiar. Carrega um violão que usa no começo da peça. No estojo do instrumento, guarda um quadro pintado pelo filho, Vicente, 5, do casamento com Adriana, para deixar no camarim. "É um talismã."
Brichta cita a companheira várias vezes. Avisa que está com planos de dirigi-la no teatro. Mas guarda segredo sobre os detalhes. "Não posso falar ainda qual o texto."
Para desviar, conta que, há alguns anos, os dois estavam em Buenos Aires assistindo a uma adaptação de "Arte" com o ator argentino Ricardo Darín no papel que agora, em SP, é de Vladimir.
"A Adriana disse: 'Monta essa peça'. Fiquei na incerteza, mas uma outra vez, também na Argentina, vimos [o espetáculo] 'Os Produtores', e ela falou: 'Só vejo você ou o Pedro Cardoso fazendo esse musical'. E fui chamado pra atuar na montagem brasileira, em 2008. Depois, me disseram que o Pedro havia sido a primeira opção."
Seu aparelho de rádio celular apita. "Me dá licença pra atender?", pede. "Oi, amor! Saudades. Tô dando uma entrevista [pausa]. Não, amor, senão vai tudo pro jornal. Quer que eu cante? 'Que falta eu sinto de você...'", cantarola a melodia de "Quero um Xodó". "Beijo, amor."
No ano passado acatou o conselho da mulher e comprou os direitos de "Arte" para dessa vez montar o espetáculo, com direção de Emilio de Mello. Produzir, diz, é assumir para si o risco.
Para levantar o dinheiro, falou até com vizinhos, no Rio. "Encontrei um cara que constrói shoppings no elevador e perguntei: 'Não quer investir?'", lembra. "Produzir é ter responsabilidade. Isso vem com a maturidade e, em alguma medida, com ser pai. Porque a gente tem que gerir e acreditar na nossa gerência. Como vou educar um filho dizendo 'ah, meu filho, não sei como se faz'. Dizer que não sabe é importante, mas tenho que confiar no meu taco."
Formado em teatro pela Universidade Federal da Bahia, Brichta atuou em mais de 20 peças. Mas foi em 2000, quando fez "A Máquina", de João Falcão, que ganhou projeção no eixo Rio-SP e, consequentemente, chegou à TV. Não só ele como seus outros colegas de elenco, também saídos de Salvador: Wagner Moura e Lázaro Ramos.
Ele não sabe explicar o sucesso dessa geração de atores da qual ele faz parte. Acha que, assim como as anteriores, com nomes como Marco Nanini e Ney Latorraca, ele e os amigos "têm muita vontade" e talento. "O Lazinho [Lázaro] é até autor, aquele bichinho miserável!"
Se recorda de quando um produtor da Globo assistiu a "A Máquina" e pediu para ele, Ramos e Moura preencherem um cadastro. "Aí alguém contou que numa ficha lá eles colocam 'bonito', 'razoável' ou 'tipo'. Tipo era feio [risos]. Era o que estavam procurando na gente. Engraçado é que depois viramos galãs, o que quebra o paradigma de que, pra ser galã, tem que ter beleza apolínea."
Desde que estreou na emissora, ele emendou um trabalho no outro, quase sempre com personagens cômicos. Depois de participar de cinco novelas, fez quatro seriados -"Amor em 4 Atos", "Faça a Sua História", "Separação" e "Tapas & Beijos". "Virei um garoto de programa [risos]."
O rótulo de ator cômico lhe deu medo. "Pensei: 'Ih, rapaz, vou ficar prisioneiro disso'. Justo eu, que não só fiz outras coisas, como tive prazer fazendo. Poderia pensar, 'tô satisfeito e vou virar o Ben Stiller [ator americano]'. Poderia, se me bastasse."
Como não bastou, recusou convites para comédias e optou por atuar no drama "Hamelin". Recentemente, voltou ao cinema. Filmou os inéditos "Coleção Invisível", de Bernard Attal, e "Minutos Atrás", de Caio Sóh. Vai agora rodar "Muitos Homens num Só", de Mini Kerti.
"A partir do convite do Bernard percebi que a coisa tava mais abrangente. Acho que isso se deve também ao fato de me associarem a Lazinho e a Wagner. Eles são dois típicos atores cômicos e dramáticos. Aí podem pensar: 'Esse rapaz veio com os outros, não é possível que ele não leve um draminha adiante", afirma, rindo.
Na vida real, Brichta levou um drama adiante por um ano e dez meses. Foi o tempo que se viu obrigado a ficar longe da filha Agnes, hoje com 14 anos. Com a morte da primeira mulher, a ex-sogra conseguiu uma liminar na Justiça para ficar com a guarda da menina.
No despacho, a juíza que cedeu a guarda de Agnes para a avó, escreveu: "Pela juventude e profissão escolhida, sem a presença da mãe da criança, a certeza da instabilidade para a criação e boa formação de Agnes em sua companhia se evidencia".
No fim de 2002, a filha voltou a morar com ele. "Foi a melhor decisão para Agnes. Já chorei muito por essa situação e hoje durmo tranquilo. Comemoro todos os dias."
"Poderia pensar: 'Tô satisfeito e vou virar o Ben Stiller. Poderia, se isso me bastasse.
Não me chateia ouvir elogios à Adriana [Esteves, sua mulher]; o trabalho dela é assombroso e a novela é mais comentada que o mensalão
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