Muitos analistas têm sublinhado a heterogeneidade dos países que compõem o Brics: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Com toda a razão, quando se trata do desempenho nas últimas décadas: enquanto o cerne do grupo, Índia e China, tem crescido a 8% ou 10% ao ano, as demais economias crescem a metade ou um terço disso. Fazer parte do Brics pode satisfazer a vaidade brasileira e alimentar esperanças quanto a articulações diplomáticas, mas é um erro tratar o grupo como homogêneo no que se refere aos temas essenciais.
Há, entretanto, lições úteis a extrair da comparação entre as experiências dos Brics e que explicam a heterogeneidade do seu desempenho. Nos quatro países, a estratégia econômica ao longo da história foi calcada em dois pilares fundamentais. De um lado, a ideia de que faria sentido reduzir a dependência do mundo exterior e dar prioridade à substituição de importações. De outro lado, a crença de que o Estado deveria jogar papel fundamental na economia não apenas como regulador, mas também como provedor de bens e serviços.
Na Rússia, a ênfase em autarquia e Estado precedeu a União Soviética. Já na Rússia czarista, a partir do final do século 19, o modelo econômico foi calcado em ação do Estado e substituição de importações. Depois de 1917, essa ênfase foi levada ao extremo. Na Índia, após período relativamente liberal entre a independência, em 1947, e a morte de Nehru, no início da década de 1960, o modelo enfatizou os mesmos alicerces até o fim dos anos 1980. Na China pré-1980, o modelo socialista ortodoxo combinava em versões extremas a intervenção do Estado e a autarquia. O isolamento da África do Sul sob o apartheid implicou que, antes de 1994, a estratégia econômica dependesse da minimização à exposição externa e de alto grau de interferência do Estado na atividade econômica.
No Brasil, a partir de meados do século 19, houve continuidade na estratégia econômica que combinava autarquia e intervenção estatal. Desde cedo no Império, as tarifas de importação eram muito altas, inicialmente justificadas por razões fiscais, mas depois claramente protecionistas. Na Primeira República, as políticas públicas deixaram de ter como alvo a correção de falhas de mercado em relação à atração de imigrantes e investimento direto estrangeiro e partiram para a administração dos preços de café, explorando o poder de mercado brasileiro. Com a grande depressão, somou-se o controle cambial à tarifa alta. Em 1944, na famosa controvérsia Gudin-Simonsen prevaleceu, na prática, a visão de Simonsen - a despeito de suas fragilidades analíticas - quanto à centralidade dos pilares calcados em autarquia e Estado.
Essa visão sobreviveu galhardamente ao golpe militar e começou a ser erodida na década de 1980 em meio de altíssima inflação combinada à estagnação. As reformas de Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso, baseadas em visão crítica da potencialidade de longo prazo dos pilares tradicionais, promoveram a abertura comercial e a privatização. Mas o que se tem visto desde 2003, e ainda mais desde 2011, é uma regressão às visões mais primitivas de estratégia econômica calcada em proteção alta e aumento do peso do Estado.
Nas economias mais dinâmicas do Brics - Índia e China -, o que se vê é exatamente o contrário da experiência brasileira no período recente. Na Índia, desde o final dos anos 1980, e na China, desde o final da década de 1970, houve verdadeiras revoluções quanto à abertura dos mercados, a expansão das exportações, atração de capitais estrangeiros e redução do peso do Estado na economia. Nos dois casos houve aumento significativo da formação bruta de capital fixo e, consequentemente, das taxas de expansão do PIB.
A formação bruta de capital fixo na Índia tem sido da ordem de 35% do PIB, saindo de um patamar, nos anos 1980, apenas um pouco melhor do que os atuais míseros 17% do Brasil. Na China, o número estaria em torno de 45%, embora haja significativas distorções de medida provavelmente significativas.
Mesmo nos membros do Brics menos bem-sucedidos, Rússia e África do Sul, nos quais a abertura das economias e a redução do peso do Estado mereceram ênfase bem menor, a formação bruta de capital fixo tem sido da ordem de 23%.
Além disso, sempre é bom relembrar que a tara nacional com relação à manutenção de altos índices de conteúdo nacional nas compras feitas, diretas ou indiretamente, pelo governo faz com que aos baixos níveis de investimento corresponda expansão da capacidade ainda mais limitada, em vista do encarecimento dos bens de capital.
Impressiona a teimosia do Planalto em deixar de reconhecer que a atual estratégia brasileira de crescimento apenas assegura que a economia alterne voos de galinha com pousos forçados. A estratégia que poderia superar a mediocridade do desempenho econômico do País deveria, com o benefício das lições que podem ser extraídas das experiências da China e da Índia, ser baseada na retomada da abertura gradual do mercado brasileiro, na reversão da nova onda estatizante e no aumento da poupança doméstica. Só então seria possível pensar em deixarmos de ser briquinho.
Há, entretanto, lições úteis a extrair da comparação entre as experiências dos Brics e que explicam a heterogeneidade do seu desempenho. Nos quatro países, a estratégia econômica ao longo da história foi calcada em dois pilares fundamentais. De um lado, a ideia de que faria sentido reduzir a dependência do mundo exterior e dar prioridade à substituição de importações. De outro lado, a crença de que o Estado deveria jogar papel fundamental na economia não apenas como regulador, mas também como provedor de bens e serviços.
Na Rússia, a ênfase em autarquia e Estado precedeu a União Soviética. Já na Rússia czarista, a partir do final do século 19, o modelo econômico foi calcado em ação do Estado e substituição de importações. Depois de 1917, essa ênfase foi levada ao extremo. Na Índia, após período relativamente liberal entre a independência, em 1947, e a morte de Nehru, no início da década de 1960, o modelo enfatizou os mesmos alicerces até o fim dos anos 1980. Na China pré-1980, o modelo socialista ortodoxo combinava em versões extremas a intervenção do Estado e a autarquia. O isolamento da África do Sul sob o apartheid implicou que, antes de 1994, a estratégia econômica dependesse da minimização à exposição externa e de alto grau de interferência do Estado na atividade econômica.
No Brasil, a partir de meados do século 19, houve continuidade na estratégia econômica que combinava autarquia e intervenção estatal. Desde cedo no Império, as tarifas de importação eram muito altas, inicialmente justificadas por razões fiscais, mas depois claramente protecionistas. Na Primeira República, as políticas públicas deixaram de ter como alvo a correção de falhas de mercado em relação à atração de imigrantes e investimento direto estrangeiro e partiram para a administração dos preços de café, explorando o poder de mercado brasileiro. Com a grande depressão, somou-se o controle cambial à tarifa alta. Em 1944, na famosa controvérsia Gudin-Simonsen prevaleceu, na prática, a visão de Simonsen - a despeito de suas fragilidades analíticas - quanto à centralidade dos pilares calcados em autarquia e Estado.
Essa visão sobreviveu galhardamente ao golpe militar e começou a ser erodida na década de 1980 em meio de altíssima inflação combinada à estagnação. As reformas de Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso, baseadas em visão crítica da potencialidade de longo prazo dos pilares tradicionais, promoveram a abertura comercial e a privatização. Mas o que se tem visto desde 2003, e ainda mais desde 2011, é uma regressão às visões mais primitivas de estratégia econômica calcada em proteção alta e aumento do peso do Estado.
Nas economias mais dinâmicas do Brics - Índia e China -, o que se vê é exatamente o contrário da experiência brasileira no período recente. Na Índia, desde o final dos anos 1980, e na China, desde o final da década de 1970, houve verdadeiras revoluções quanto à abertura dos mercados, a expansão das exportações, atração de capitais estrangeiros e redução do peso do Estado na economia. Nos dois casos houve aumento significativo da formação bruta de capital fixo e, consequentemente, das taxas de expansão do PIB.
A formação bruta de capital fixo na Índia tem sido da ordem de 35% do PIB, saindo de um patamar, nos anos 1980, apenas um pouco melhor do que os atuais míseros 17% do Brasil. Na China, o número estaria em torno de 45%, embora haja significativas distorções de medida provavelmente significativas.
Mesmo nos membros do Brics menos bem-sucedidos, Rússia e África do Sul, nos quais a abertura das economias e a redução do peso do Estado mereceram ênfase bem menor, a formação bruta de capital fixo tem sido da ordem de 23%.
Além disso, sempre é bom relembrar que a tara nacional com relação à manutenção de altos índices de conteúdo nacional nas compras feitas, diretas ou indiretamente, pelo governo faz com que aos baixos níveis de investimento corresponda expansão da capacidade ainda mais limitada, em vista do encarecimento dos bens de capital.
Impressiona a teimosia do Planalto em deixar de reconhecer que a atual estratégia brasileira de crescimento apenas assegura que a economia alterne voos de galinha com pousos forçados. A estratégia que poderia superar a mediocridade do desempenho econômico do País deveria, com o benefício das lições que podem ser extraídas das experiências da China e da Índia, ser baseada na retomada da abertura gradual do mercado brasileiro, na reversão da nova onda estatizante e no aumento da poupança doméstica. Só então seria possível pensar em deixarmos de ser briquinho.
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