Instituições regionais são uma característica saliente do cenário político da América do Sul. Em um continente com doze países, existem mais de dois parlamentos regionais, duas uniões aduaneiras e uma união intergovernamental mais abrangente. Apesar de todas essas iniciativas, boa parte dessas instituições é fraca ou inacabada, ou ambas. Parafraseando um observador, a habilidade de líderes locais de transformar miligramas de fatos em toneladas de palavras - ou, nesse caso, instituições regionais ineficazes - é impressionante.
A recente reunião de cúpula do Mercosul foi um reflexo da ineficácia em lidar com os problemas mais graves da região. Em meio à preocupação crescente com os rumos da economia global, os líderes reunidos na Argentina tiveram de administrar crises, a começar pela queda abrupta de Fernando Lugo da presidência do Paraguai. Sob a alegação não tão cristalina de ruptura institucional, o episódio acabou por motivar a suspensão de Assunção do bloco sul-americano. Não bastasse, os lideres regionais aproveitaram a suspensão do país guarani para aprovar, "por unanimidade", a admissão da Venezuela como membro pleno do Mercosul - o Paraguai, afinal, se opunha à entrada de Caracas no bloco.
O saldo foi negativo para o Mercosul. Além dos questionamentos sobre a legalidade da "troca" do Paraguai pela Venezuela e dos sinais confusos em relação ao comprometimento regional com normas democráticas, as decisões tomadas na última reunião de cúpula agravarão ainda mais a já frágil dinâmica econômico-comercial do Mercosul.
Quando o Paraguai voltar ao bloco depois das eleições presidenciais do ano que vem, como é esperado, o fará provavelmente sem ter ratificado o documento de adesão da Venezuela. Isso significa que o Paraguai não terá internalizado as normas necessárias para reconhecer Caracas como integrante pleno do bloco, o que na prática permitiria ao Paraguai ignorar a decisão e provavelmente criar restrições a produtos venezuelanos.
Para uma instituição já eivada de exceções e improvisos, a entrada de uma economia díspar como a da Venezuela, sujeita aos rompantes de Hugo Chávez e dependente de apenas um produto - petróleo -, reduzirá ainda mais a capacidade de coordenação de dentro do Mercosul. É notório o fato que as disputas entre Brasil e Argentina têm enfraquecido a capacidade negociadora do Mercosul, como foi o caso das negociações com a União Europeia. Nos últimos anos, enquanto outros países latino-americanos assinaram acordos de livre comércio com as principais economias do mundo (EUA, UE e China), o Mercosul assinou apenas três: Israel, Egito e Autoridade Palestina.
Para se ter uma ideia do impacto do emaranhado de exceções e do improviso no comércio, o ritmo das exportações brasileiras para a Argentina tem desacelerado consistentemente, devido principalmente a salvaguardas impostas por Buenos Aires. Nos primeiros cinco meses de 2012, a Argentina recebeu menos de 8% do total das exportações brasileiras, bem menos do que os 13% alcançados em 1998. Ademais, o Brasil sinalizou recentemente que pode reduzir voluntariamente em 30% (para US$ 2 bilhões) o superávit com a Argentina para ajudar o pais vizinho a cumprir com suas obrigações financeiras.
Ao revelar as fragilidades do Mercosul, a cúpula do mês passado apontou não apenas para menos livre comércio na região, mas também para a ausência de uma agenda factível de negociação com terceiros países. Já em relação ao Paraguai, é provável que os problemas políticos se dissipem antes de terem algum impacto substantivo na região, exceto se o país decidir abandonar o Mercosul em definitivo para negociar acordos de livre comércio por conta própria - ou criar mais uma instituição regional.
Nenhum comentário:
Postar um comentário