A situação da Espanha é grave e, portanto, a da Europa. No fim de semana, a imprensa alemã passou a divulgar informações de planos do governo de Angela Merkel que vão além da receita habitual. Os remédios tradicionais não estão funcionando. Os economistas admitem que a situação é cada vez mais delicada.
- Tenho tido dificuldade de enxergar uma saída. O medo não é só pela saúde dos bancos espanhóis, mas também sobre se a Espanha vai continuar no euro. Os bancos estão arrastando o governo para a crise e o governo espanhol já tem déficit e dívida altos - diz José Júlio Senna, da MCM Consultores.
A Espanha vive os desdobramentos do estouro de uma crise imobiliária, e os bancos têm que fazer provisão de até 50% do valor desses ativos. A onda de desemprego torna ainda mais difícil manter o pagamento em dia. Se o governo espanhol tentar captar para capitalizar os bancos, estará assumindo que o sistema precisa de resgate. Se nada fizer, pode haver uma crise de confiança.
- Agora está impossível dizer o que vai acontecer. O problema espanhol não pode ser empurrado com a barriga. O FMI calcula que o sistema financeiro da Espanha precisaria de 250 bilhões a 300 bilhões para ser saneado - diz Monica de Bolle, da Galanto Consultoria.
A Irlanda aumentou drasticamente o endividamento público para apoiar seu sistema bancário que estava desmoronando. Monica acha que esse terá de ser o caminho da Espanha:
- Se a capitalização dos bancos for a conta-gotas não vai funcionar. O problema de capitalizar os bancos é que o problema é dinâmico. Um aporte hoje não significa que eles não precisarão de novos depósitos amanhã.
O país está num círculo vicioso: os preços dos imóveis caem e tornam a dívida mais cara que o valor do ativo; as pessoas perdem o emprego e param de pagar; os bancos entram em dificuldade; os preços dos imóveis caem mais. Diante da mesma situação, a Irlanda salvou os bancos, mas a um custo altíssimo: a dívida/PIB que havia sido derrubada de 90% para 25%, de 1994 até 2007, deu um salto para 110% do PIB.
Há fuga de capitais da Espanha. O Ibex, índice da bolsa de Madrid, recua 27% este ano e 40% em 12 meses. O sistema financeiro espanhol sofreu 31 bilhões em saques no mês de abril. No ano, 99 bilhões deixaram o país, com 66 bi apenas no mês de maio.
A Europa tem cerca de 100 bilhões no Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (Feef). No início de julho, começa a funcionar o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE), que irá incorporar o Feef e terá cerca de 500 bilhões. Mas esse mecanismo não pode emprestar para os bancos, apenas para os governos. A Espanha não quer pedir resgate porque isso submeteria o país à troica - o grupo de auditores do FMI, Banco Central Europeu e Comissão Europeia. Ontem, no entanto, o ministro da Economia, Cristóbal Montoro, admitiu que "as portas do mercado estão fechadas para a Espanha". Isso significa que o país sozinho não poderá captar. É uma indicação de que pode vir a admitir ser resgatado pela Europa.
Enquanto isso, o rendimento dos títulos alemães continua em queda, num sinal de que os investidores consideram o país um porto seguro. Mas a divulgação de indicadores ruins da economia alemã levou a revista "Der Spiegel" a questionar a sustentabilidade do país num contexto de enfraquecimento dos vizinhos. A bolsa alemã acumula queda de 20% nos últimos três meses; a produção de automóveis caiu 17% em maio, na comparação com o mesmo mês de 2011; e as exportações recuaram 13%, na mesma comparação.
- Existe uma dependência forte da Alemanha em relação à Zona do Euro. Boa parte do superávit alemão foi construído a partir de déficits de seus parceiros. Quando o déficit é revertido, a Alemanha passa a perder o seu principal motor de expansão - explicou o economista-chefe da Tov corretora, Pedro Paulo Silveira.
Na tentativa de se preparar para o imprevisível, o banco Morgan Stanley traçou quatro cenários para a Zona do Euro. O primeiro é de aprofundamento fiscal e político na região, que seria o ideal para solucionar a crise, mas também é o mais difícil de acontecer. O segundo é o mais provável, segundo o banco, de continuação do quadro atual, com os governos fazendo reformas isoladas e apagando incêndios de crise. O terceiro reforça a união fiscal, mas não combate as desigualdades entre países que usam a mesma moeda. O quarto é o pior, de fracasso no combate à crise e ruptura da Zona do Euro.
O mês de junho apenas começou e a agenda na Europa será intensa. Há eleições parlamentares na França, que podem deixar o país politicamente dividido. Na Grécia, haverá uma nova tentativa para a formação de governo. Na Espanha, testes de estresse serão feitos para medir a solvência dos bancos. São eventos com enorme capacidade de causar turbulência nos mercados.
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