CORREIO BRAZILIENSE - 21/06
Se Dilma tivesse que respeitar a lei eleitoral em caso de eventos internacionais, poderia ser punida por transporte de eleitores. Ela aproveita a Rio+20 para, corretamente, estreitar relações com os países africanos
Com a Rio+20 praticamente limitada a um “caldo ralo” em termos de avanços de financiamentos para o desenvolvimento sustentável, a aposta desses dois dias para muitos países será mesmo na possibilidade de encontros bilaterais. E, no caso do Brasil, está clara a prioridade aos países africanos, ao ponto de o governo oferecer “carona” a várias comitivas do continente em aviões da Força Aérea Brasileira.
Dos 64 pedidos de audiência que a presidente Dilma Rousseff recebeu, haverá tempo para 10, sendo três dedicados aos africanos. Além de um jantar com a União Africana — solução encontrada com o auxílio do prefeito Eduardo Paes e com o governador Sérgio Cabral, para que todos os presidentes do continente presentes pudessem ter uma conversa com Dilma, ainda que mais informal — ela recebeu para conversas reservadas os presidentes do Senegal, Macky Sall; e o da Nigéria, Goodluck Jonathan; e vai conversar com o presidente do Congo, Joseph Kabila, em audiência hoje, às 15h.
O sinal é claro: a aposta deflagrada no governo Luiz Inácio Lula da Silva não só tem a total concordância da presidente como deverá ser ampliada, conforme a visão de diplomatas brasileiros. E com total aval de Lula, também convidado para o jantar hoje com representantes da União Africana.
Por falar em aposta…
Você leitor, às vezes, pode se perguntar por que diabos a presidente Dilma aposta na África. Afinal, você que tem memória deve se lembrar de que Lula, em certa ocasião não muito distante, cometeu a gafe de dizer que a Namíbia era tão “limpinha que nem parecia a África”. Mas saiba que ali no caso da aposta na África, Lula não estava errado nem “malufou” como fez agora na campanha de prefeito de Fernando Haddad em São Paulo.
A aposta de Lula foi correta. Afinal, é preciso ter em mente que, em política externa, assim como na vida, vale o ditado que quem chega primeiro bebe água limpa. Como me disse ontem um alto funcionário do Itamaraty, nem sempre o que parece filantropia pode ser encarado como tal. Isso inclui a carona da FAB. Há toda uma estratégia de aposta no futuro envolvida nesse relacionamento e na escolha da agenda em um evento tão repleto de rodadas de negociações como a Rio+20.
Por falar em “carona”…
No caso da “carona”, se Dilma tivesse que cumprir as regras eleitorais na Conferência da ONU certamente seria punida por transporte de eleitores. Afinal, os países africanos têm jogado em parceria com o Brasil nos eventos multilaterais, como a Rio+20. Se dependesse do G-7, onde o continente tem mais peso, certamente o documento final da Rio+20 seria bem mais ambicioso do que o acordado em bloco com os europeus e os Estados Unidos, que ameaçavam reabrir tudo, caso houvesse uma insistência em reformular o texto fechado antes da chegada dos chefes de estado à Conferência.
E votos não são o único aspecto a levar em conta nesse estreitar de relações. Há todo o interesse em levar empresas brasileiras nas áreas de fabricação de móveis, materiais de construção, e de energia para os países africanos em desenvolvimento. E a África é hoje o pedaço da terra que cresce mais do que a Ásia. Ok, você pode pensar que, para quem sai praticamente do zero, qualquer crescimento soa grande, algo do tipo, “em terra de cego quem tem olho é rei”. Mas não é por aí. Vale averiguar o que fazem outros países em relação à África.
E se você, leitor, considera o chinês um comerciante de primeira grandeza há milênios, saiba que eles veem a África como a próxima fronteira. E estão investindo lá recursos com os quais o Brasil não tem condições de competir. São quase US$ 70 bilhões. E chinês não brinca com dinheiro. Se a África não fosse uma aposta positiva, eles não estariam jogando seus preciosos recursos no continente. Pelo visto, ao contrário do que disse há alguns anos o nosso então presidente, a África está cada vez mais brilhante aos olhos do mundo, em especial, do Brasil.
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