O GLOBO - 12/06
Hoje em dia, o idoso idioma, um tanto fora de moda, também se presta, e talvez com maior frequência, a esforços de ironia. Foi o caso, outro dia, da reação do ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello a uma alfinetada de um cacique do PT - o secretário nacional de comunicação, André Vargas.
Falando sério, alfinetada é definição modesta: Vargas acusara o STF de ter cedido a pressões não identificadas quando marcara para agosto, em plena campanha eleitoral, o início do julgamento do mensalão (escândalo tão notório que já se transformou em substantivo comum: só falta virar verbete de dicionário).
Marco Aurélio deu o troco afirmando que a denúncia de Vargas não passava de exercício do "jus esperneandi" - uma ironia em latim de araque: esse "direito de espernear" nunca foi exercido ou sequer mencionado na Roma antiga.
Mas ele existe no mundo moderno. Em geral, espernear (no sentido figurado de protestar com mais ênfase do que argumentos) é o recurso de quem carece de munição sólida para se defender de acusações pesadas, com consequências provavelmente dolorosas. O que, a propósito, define com bastante precisão o que pode acontecer com o PT no julgamento do mensalão.
Se há na plateia cidadãos com memória curta, convém lembrar que estamos falando de um dos mais notórios e sérios escândalos políticos da história recente do país. E que deve (ou, sejamos realistas, deveria) ser julgado tão cedo quanto possível.
Se isso coincidir com uma temporada de campanha eleitoral, não deixará de ser um bom momento para refrescar a memória do eleitorado. Inclusive porque é bem possível que uma surra nas urnas venha a ser a única punição que venha a cair sobre as cabeças dos políticos envolvidos no mais sério escândalo da história política recente do país.
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