CORREIO BRAZILIENSE - 12/05/12
Há poucas coisas tão maçantes como uma sessão no plenário do Senado. Mesmo com o recinto lotado, como na última quarta-feira. Ali, além do nobre Demóstenes Torres (ex-DEM-GO), tinha mais. Discursos dramáticos como o do tucano Mário Couto (PA) — xingando os petistas — e até emotivos, como o do petista Eduardo Suplicy (SP), preocupado com a voz da ex-mulher, Marta, que comandava os trabalhos e àquela altura estava afônica. Aquela noite, entretanto, foi especial. Um projeto histórico foi aprovado.
A sessão de 9 de maio acabou com os 14º e 15º salários dos parlamentares. Antes das comemorações, um pouco da história da picaretagem. Os extras foram institucionalizados em 1995 para bancar os gastos com a mudança de políticos recém-eleitos para Brasília, como se os camaradas fossem de fato morar aqui, e não nos estados de origem. A partir da lógica torta dos beneficiados, o 14º pagaria a chegada ao Congresso. O 15º, por sua vez, serviria para cobrir o custo da volta, no fim do mandato, quando o parlamentar fosse defenestrado pelo eleitor ou assumisse cargo no estado natal.
Mesmo assim, a justificativa de araque só seria razoável se os ilustres deputados e senadores desejassem de fato passar o período do mandato em Brasília, e não apenas as terças, as quartas e as quintas. O absurdo, entretanto, é ainda maior. Os nossos políticos decidiram incorporar o benefício ao contracheque. Todos os anos, como se fizessem uma mudança a cada 12 meses para o estado de origem. Do Congresso, a prática estúpida com o dinheiro do contribuinte se espalhou por assembléias estaduais e câmaras municipais, incluindo a casa onde habitam os nossos nobres deputados distritais.
Dificuldades
Pois bem, na noite da última quarta-feira algo começou a mudar no Congresso. Os senadores derrubaram, por unanimidade, os salários extras, depois da votação da Lei Geral da Copa, do discurso irado de Mário Couto e da intervenção cuidadosa de Suplicy. Foi o primeiro e decisivo passo para aprovar um projeto apresentado ainda no ano passado pela hoje ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, que acaba com a estupidez. Um ponto: ainda falta a tramitação na Câmara dos Deputados.
Apesar do otimismo da vice-presidente da Casa, Rose de Freitas (PMDB-ES) — “é um projeto com forte apelo popular, dificilmente enfrentará resistência” —, os líderes do PMDB e do PT ouvidos pela reportagem do Correio deixaram claro o desconforto em tratar do assunto na Câmara. O peemedebista Henrique Eduardo Alves e o petista Jilmar Tatto, depois de desconversarem, disseram que não discutiram o tema com as bancadas. E, assim, jogaram um balde de água fria na expectativa de o projeto ser aprovado com rapidez. “Estávamos tratando de outros temas”, disse Tatto.
É preciso que seja dito que os benefícios extras dos senadores e deputados — e por tabela dos distritais, estaduais e vereadores — são esdrúxulos para qualquer cidadão brasileiro, que, no máximo recebe 13 salários por ano. Por mais que amparado nas regras do Congresso, é um acinte, afinal, na prática que os paga é o trabalhador que não os recebe. É o seu dinheiro, meu caro leitor, que enche o bolso dos camaradas duas vezes por ano. Se há bons combates para a sociedade, o fim dos rendimentos extras dos congressistas é um dos principais. Abaixo os 14º e 15º salários de uma vez por todas.
Outra coisa
A aprovação do fim do 14º e do 15º salários no Senado foi celebrada pelos repórteres deste Correio, que desde a derrubada do benefício na Câmara Legislativa, ainda em fevereiro, pautou o tema numa série de reportagens. Uma das mais significativas: a revelação de que os senadores não pagavam o Imposto de Renda dos rendimentos extras recebidos. No fim da sessão da última quarta-feira, Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) — ao cumprimentar a Presidência do Senado por ter colocado o projeto na pauta —, destacou: “Parabenizo o Correio, um jornal da nossa cidade, por ter levantado e discutido essa bandeira”. O trabalho de reportagem continuará durante a tramitação do projeto na Câmara dos Deputados.
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