O ano passado foi de queda na maioria dos setores cotados em bolsa. Este ano, está volátil. Já esteve mais forte e cedeu muito. Esta semana foi ruim por motivos externos. Os setores que mais sobem este ano são os beneficiados pela restrição às importações, os ligados ao consumo, ou os que têm reajustes de preços indexados à inflação. Na outra ponta, despencaram nos últimos dois meses as ações dos bancos, da Petrobras, e das construtoras.
O setor de veículos e peças lidera com folga a valorização desde janeiro. Cresce 35% e se beneficia da política de proteção à produção nacional de carros e componentes. O curioso é que os primeiros meses do ano foram ruins para a indústria automobilística, que esta semana divulgou que o número de carros em estoques só não é pior do que o do estouro da crise no fim de 2008.
Logo atrás, vêm setores ligados ao consumo, como telecom, com alta de 18,2%, e varejo, com 15,4%. O setor de telecomunicações consegue repassar a alta da inflação para os seus preços com mais facilidade, e o setor de varejo é impulsionado pelo estímulo ao consumo, puxado por um mercado de trabalho forte e pela ampliação do crédito. Energia elétrica, que sobe 8% no ano, também tem reajustes anuais com base na inflação.
Na outra ponta, três setores chamaram atenção pelas quedas expressivas das ações: construção civil, financeiro, e petróleo e gás. As construtores sentem o peso do crescimento acelerado, a principal empresa de petróleo do país tem prejuízo com o congelamento da gasolina, e os bancos estão sendo afetados pelo aumento da inadimplência, de um lado, e a pressão do governo por juros menores, de outro.
O tempo virou para eles. Até março, as construtoras estavam subindo 27%. O setor de petróleo e gás disparou 20% entre janeiro e fevereiro, e o financeiro tinha alta de 15% até 13 de março. De março a abril, enquanto o Ibovespa acumulou queda de 6,1%, as ações das construtoras caíram 23,4%. Perderam quase um quarto do valor de mercado em 60 dias. A PDG Realty tombou 38,7%. A Gafisa, que acumula queda de mais de 70% desde novembro de 2010, viu suas ações perderem 25,9%. O setor de petróleo e gás caiu 14,1% no bimestre, com queda de 12% da Petrobras e 22,2% da OGX. O setor financeiro recuou 10,7%. O Itaú perdeu um quarto do valor desde 16 de março.
De acordo com a analista-chefe da Ativa Corretora, Daniella Maia, os setores financeiro e de petróleo e gás sentem as interferências do governo na economia. Os bancos, no mesmo período em que são obrigados a aumentar a provisão de crédito inadimplente, estão sofrendo pressão para reduzirem juros. No setor de petróleo, a Petrobras é impedida de aumentar o preço da gasolina, mesmo tendo que importar o produto para vender aqui dentro. Embora o Brasil não seja visto como um país que rasgue contratos, a onda de expropriações de empresas estrangeiras que aconteceu na América do Sul nos últimos anos deixa os investidores estrangeiros mais reticentes.
- Quando se olha para finanças e petróleo, percebe-se que os investidores estão incomodados com as intervenções. Na parte dos bancos, em querer mexer no spread e na taxa de juros, no setor de petróleo, em definir o preço da gasolina. A intervenção está mais forte este ano, e principalmente o investidor estrangeiro não gosta disso - disse Daniella.
A queda dos spreads vai melhorar a eficiência econômica porque com queda nos juros bancários há menor risco de inadimplência. Mas o investidor, mais imediatista, conclui que a rentabilidade será menor e por isso todos os bancos, inclusive os estatais, estão com cotações em queda.
Na construção civil, o crescimento forte nos últimos anos está em cheque. Os gargalos começaram a aparecer, com encarecimento da mão de obra, falta de terrenos e dificuldade de financiamentos. O processo de consolidação nacional do setor não começou bem. A incorporação da Tenda pela Gafisa, e da Agre, pela PDG, trouxe enormes prejuízos às duas empresas. As construtoras não estão conseguindo entregar as encomendas no prazo e no preço prometido. O resultado foram resultados trimestrais que decepcionaram.
- As grandes construtoras foram para outros estados e fizeram parceria com construtoras locais. A ideia era: "você toca a obra, mas usa a minha marca." Isso não deu certo, houve estouro de orçamento e atraso, mostrando que esse modelo de expansão não será tão simples quanto parece. As empresas agora estão fazendo o caminho de volta - disse o analista Flávio Conde, que acompanha o setor de construção civil pela Banif Securities.
Bolsa em alta não é atestado de saúde, e em grande parte a Bovespa oscila ao sabor das ondas internacionais. De qualquer maneira, fica o aviso aos marinheiros com estômagos mais fracos. No ano passado foi um verdadeiro mar vermelho a evolução das ações de vários setores. Este ano, os setores começaram surfando a recuperação e alguns já mergulharam. Para o investidor de bolsa, é preciso um redobrado cuidado. Para quem analisa a economia, o sobe e desce é sinal de que a era da incerteza continua.
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