sábado, maio 05, 2012

Miopias do modelo de desenvolvimento - CARLOS RODOLFO SCHNEIDER


O ESTADO DE S. PAULO - 05/05/12


De janeiro a outubro de 2011, o Brasil teve um superávit de US$ 75,2 bilhões na balança comercial de produtos básicos e de US$22 bilhões com os semimanufaturados. Por outro lado, os manufaturados apresentaram um déficit de US$75,9 bilhões no período, com estimativa da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) de saldo negativo beirando os US$100 bilhõessomenteem2011. Esses números assustam, se comparados a um histórico brasileiro de superávits da indústria de transformação.

São sinais claros da perda de competitividade da indústria brasileira e do franco processo de desindustrialização em andamento no País.

Existem aqueles que procuram suavizar o problema, contrapondo informações sobre investimentos programados por grupos empresariais, mas a verdade é que a indústria de transformação vem perdendo participação no Produto Interno Bruto (PIB), ano após ano.Em2010,representou16,2% e,em 2011, caiu para 14,6%. Pior: mesmo representando hoje apenas 1/7 da produção do País, o setor arca com 1/3 do total dos impostos,uma carga insuportável e injusta.

Para combater o crescente problema da desindustrialização, interferir diretamente no câmbio é paliativo de curto prazo. Câmbio competitivo requer equilíbrio fiscal para evitar desestabilização dos preços. O problema é que, para cobrir os gastos de uma máquina pública inchada e ineficiente, o Estado brasileiro impõe à sociedade uma carga tributária incompatível com o nosso estágio de desenvolvimento.

Não o bastante, ainda tem de neutralizar a pressão do excesso de gastos públicos sobre o índice de preços com uma taxa de juros que atrai demasiados recursos externos especulativos, o que acaba penalizando a produção no País.

Competir num mercado internacional cada vez mais disputado, a partir de uma posição desvantajosa em termos de infraestrutura, taxa de juros, carga tributária e legislação trabalhista defasada, coloca um desafio gigantesco às empresas e ao País. Basicamente, apenas um grupo restrito de produtores nacionais de commodities e semimanufaturados tem conseguido caminhar bem nesse ambiente, em razão de fortes vantagens comparativas internacionais do Brasil.O poder público precisa fazer a sua lição de casa para que as demais cadeias produtivas consigam sobreviver diante de tal cenário.

Felizmente, a natureza nos deu em abundância o que outros países precisam muito, e não há dúvida de que devemos aproveitar este bom momento de um mercado mundial de commodities com alto potencial de compra,puxado pela China.O que não devemos, todavia, é, em razão disso, preterir a indústria de transformação, que integra os setores mais dinâmicos da economia e intensivos em tecnologia - os quais configuram uma base importante que o País levou anos para construir, e que consumiu recursos e muita energia de diferentes governos, empresas e sociedade. Deixamos de dar a necessária atenção aos desafios estruturais do País em razão do aparente sucesso de corrente de fatores conjunturais influenciados pelos altos preços dos produtos agrícolas e minerais exportados. É uma miopia que compromete o nosso crescimento logo em seguida.

Para amenizar a crescente perda de competitividade de cadeias produtivas, o governo vem concedendo benefícios e incentivos a uns poucos setores, medidas que vêm distorcer ainda mais a equação fiscal e a competitividade da economia do País como um todo.

Comprometem-se recursos que terão de ser recuperados junto dos demais agentes econômicos, enquanto não alcançarmos o necessário ajuste das contas públicas.Ajuste que,de forma saudável, dispensará medidas protecionistas, que combatem a febre, mas não atacam suas causas. Planos consistentes requerem vontade pública, do governo e do Congresso.

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