FOLHA DE SP - 05/05/12
Ayres Britto diz que os magistrados não governam, mas existem e atuam para "evitar o desgoverno"
O MINISTRO Ayres Britto, presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), mostrou-se comunicador nato ao tornar clara a mensagem à nação no dia de sua posse. Volto ao assunto porque, se a melhor administração é regida pelos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (Constituição, art. 37), nos Estados e municípios a nota do Poder Executivo não é alta no conceito do povo. Já a presidente da República tem bons motivos para estar feliz.
E a magistratura? Britto anotou que nossa Constituição tem o inexcedível mérito de partir do governo possível para a melhor administração possível. Vê o Poder Judiciário "estrategicamente situado entre os fundamentos da República e os objetivos igualmente fundamentais dessa República". Diz bem que os magistrados não governam, mas existem e atuam para "evitar o desgoverno, o desmando e o descontrole final", quando provocado. Idealmente é assim.
Sem afastar preocupações com a paz interna do STF, Ayres Britto insistiu em situar o Judiciário como o "poder que evita o desgoverno, o desmando e o descontrole eventual dos outros dois". Por isso, acrescentou: "Não pode, ele mesmo, se desgovernar, se desmandar, se descontrolar". Esse é o ponto a discutir.
Como o Brasil vê o Judiciário? No maior tribunal do país, o presidente Ivan Sartori foi apanhado no fogo cruzado entre velhos e novos companheiros da desembargadoria, dos que se beneficiaram de vantagens financeiras, algumas delas já noticiadas, e dos excluídos. Para ver nessas condutas a verdadeira legalidade, elas teriam de ser iguais para todos. Sartori enfrentará a correção do sacrifício da maioria. Tem qualidade para a tarefa.
A queixa de haver jornalistas dos meios eletrônicos ou impressos que não entendem o Judiciário se vincula à dificuldade do povo em compreender o enunciado dos atos processuais e de seus efeitos. Há questões nas quais não há como fugir da tecnicidade. Mas, em outras, o excesso da técnica obscurece a comunicação. Afinal, o todo da população heterogênea é o credor principal da informação clara. Embora fechar o valo que separa os profissionais dos dois lados seja difícil, será dia de festa aquele em que, compreendendo-se reciprocamente, possam unir esforços para o acesso compreensível entre os atores no drama da comunicação geral (emitentes da declaração) e os destinatários dela.
Voltemos a Ayres Britto. Depois de lembrar que o "Poder Legislativo não é obrigado a legislar, mas o Poder Judiciário é obrigado a julgar", apontou requisitos mínimos para um juiz. Referiu "serenidade ou equilíbrio emocional", sem confundir calma com lerdeza. "Juiz e parte são como água e óleo: não se misturam." Tratar "as partes com urbanidade ou consideração implica o descarte da prepotência e da pose", para lembrar que "quem tem o rei na barriga um dia morre de parto". O magistrado deve observar, segundo Britto, o mundo circundante. Ser atento às provas dos autos sem ser refém da opinião pública no apreciar "teses em confronto".
Os sete meses da presidência de Ayres Britto no Supremo Tribunal combinarão a importância dos temas enfrentados com o cuidado na transmissão clara dos fatos ao povo. Os meios de comunicação estarão atentos.
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