No primeiro grande escândalo ocorrido depois do estouro do mensalão, o da tentativa de compra de um dossiê fajuto contra José Serra,em 2006, o presidente Lula repetiu o gesto da condenação pública que fez no ano anterior. Na descoberta dos mensaleiros, em 2005, ele foi a público pedir desculpas ao povo brasileiro. Já no final da campanha eleitoral do ano seguinte, quando a Polícia Federal desmantelou a trama do dossiê, e até apreendeu uma sacola repleta de dinheiro, Lula optou por desqualificar os militantes envolvidos na trapalhada. A ação rocambolesca, supõe-se, ajudaria o candidato petista Aloizio Mercadante.
Ali surgiram os “aloprados”, termo da lavra presidencial. Pois há muitas evidências de que eles reapareceram na barafunda em que se transformou esta investida supostamente para usar a CPI do Cachoeira a fim de atemorizar o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e, por meio de pressões sobre o ministro Gilmar Mendes, do Supremo, emparedar a própria Corte — ou, quem sabe?, ganhar um voto para a causa da postergação do julgamento do mensalão, tema que atormenta a ala radical do PT.
Pelo menos até ontem, a rápida e cortante reação de Gilmar Mendes aos desdobramentos da revelação da “Veja” de que Lula propusera ao ministro ajudar no adiamento da entrada do processo em julgamento, em troca de proteção na CPI, ofuscou os desmentidos da versão confirmada por ele.
Em entrevista coletiva na terça- feira, na qual não permitiu a entrada de fotógrafos e cinegrafistas, Mendes distribuiu acusações a “gângsteres” que teriam espalhado que haveria provas, no material recolhido pela PF nas investigações contra o esquema Cachoeira/Delta/Demóstenes, de que o ministro do STF e o senador viajaram a Berlim em avião do contraventor e/ ou com as despesas pagas por ele. Talvez por isso, deduz-se, precisaria de proteção na CPI.
Mas o ministro provou com documentos que fora à Alemanha às expensas do STF, num primeiro trecho da viagem, e, no segundo, pago com o próprio dinheiro. Também na terça, Demóstenes, ao depor no Conselho de Ética do Senado, confirmou a explicação de Mendes.
Uma evidência de que aloprados agiram, com a incompetência revelada em 2006, é que, ao “Jornal Nacional” daquela noite, ao ser ouvido nos corredores da CPI, o deputado Jilmar Tatto (PT-SP) reconheceu que a prova documental de Gilmar Mendes era definitiva e admitiu que se pensava levar o suposto caso do ministro do Supremo à comissão. Desenhou-se, então, de forma nítida um plano para constrangê-lo, como foi feito com Roberto Gurgel, pelo fato de o procurador não ter dado sequência a um primeiro inquérito em que Demóstenes aparecia, para, explicou, não prejudicar novas investigações. Deu certo. A ligação de Gurgel com o mensalão é que será ele a encaminhar, pelo Ministério Público, as acusações contra os mensaleiros no julgamento do caso.
Frustrada a manobra — inspirada em comédias do tempo do cinema mudo —, é preciso esvaziar qualquer possibilidade de crise política, tampouco institucional. Não faz sentido deixar o andamento do processo do mensalão no STF e os trabalhos — por mais arrastados que estejam — da CPI serem prejudicados por mais uma ação de aloprados digna de “Os Trapalhões”.
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