A França parou de crescer, o desemprego subiu, a dívida aumentou com a crise de 64% para 87% do PIB, o gasto público é alto e os impostos já são bem elevados. Governar o país nos próximos cinco anos não será fácil, mas a esquerda e a direita disputarão ferozmente nestas duas semanas até o segundo turno. O quadro que saiu das urnas é favorável ao Partido Socialista de François Hollande. A incerteza continuará até a eleição parlamentar.
A decisão a ser tomada pelo eleitorado francês no dia 6 de maio não encerra a definição de como será o governo. Como a França é um regime semipresidencialista, o Parlamento tem muito poder. Se Hollande ganhar, mas não conseguir maioria no legislativo, terá que se formar um governo que eles chamam de coabitação, em que a governabilidade é ainda mais difícil. Por outro lado, quem negocia com a Europa é o presidente. O interlocutor de Angela Merkel no comando da crise mudará se o Partido Socialista ganhar. Hollande já se posicionou contra propostas que foram firmadas entre os dois países.
A diferença de percentual de votos entre François Hollande e Nicolas Sarkozy foi muito pequena no primeiro turno, mas Hollande sai como favorito nesta corrida final. A primeira vantagem será na distribuição de votos. Os 10% de Jean-Luc Mélenchon, de extrema-esquerda, devem ir quase integralmente para Hollande, que deve ficar também com 1/3 dos votos do partido de centro de François Bayrou, e outro terço deve se abster. A espantosa votação de 18% de Marine Le Pen vai preferencialmente para Sarkozy, mas uma parte vai se abster, e outra parte tende a votar na esquerda. Nem todo voto de Le Pen é ideológico. Um percentual é de protesto.
Sarkozy fez ontem acenos aos eleitores de Le Pen. Para atrair os votos ideológicos da Frente Nacional, ele terá que ir mais para a direita, o que o fará perder votos do centro. Já Hollande poderá caminhar para o centro.
A segunda vantagem de Hollande é o desgaste de Sarkozy depois de cinco anos de governo. Tem ainda a maldição da crise, que está derrubando governos em toda a Europa. Já tiveram que entregar seus cargos para a oposição o britânico Gordon Brown, o grego Papandreau, o espanhol Zapatero. Caiu também o governo italiano de Berlusconi.
Sarkozy pode crescer no debate, porque Hollande é conhecido por sua falta de carisma. Por isso, o presidente atual propôs três confrontos. Hollande quer apenas um.
Para ajustar as contas, os dois candidatos prometeram aumentar os impostos sobre os mais ricos, só que Hollande chegou a falar em 75%, o que é muito até para um país acostumado com altas alíquotas de Imposto de Renda. A diferença entre os dois é de quem cobrar e de que forma recolher esse imposto extra que recairia sobre grandes empresas e os mais ricos. Os dois prometeram construir mais habitação para reduzir o preço dos imóveis.
Na educação, Hollande promete criar 60 mil postos de trabalho; já Sarkozy promete não renovar 50% das vagas de professores que forem se aposentando, exceto os do ensino fundamental. Para criar mais empregos, Hollande quer eliminar incentivos fiscais às horas extras e dar incentivo fiscal para a empresa que contratar jovens. Sarkozy quer implementar o que ele chama de pactos de competitividade entre empregadores e trabalhadores. Nenhum dos dois tem proposta convincente para enfrentar o desemprego, que era de 7% antes da crise e agora está em 10%, e entre jovens é 21%. Nenhum dos dois prometeu reformas estruturais que realmente enfrentem a crise.
O banco francês BNP Paribas analisou os programas dos candidatos. Sarkozy promete colocar as contas em ordem até 2016, com dois terços do ajuste via cortes de gastos e um terço por aumento de receita. Hollande quer um ano a mais de tempo e tem estratégia que depende mais do crescimento econômico porque metade do seu ajuste será por aumento de arrecadação. Mas eles não detalharam onde passarão a tesoura. O ajuste será difícil porque a economia está crescendo pouco. O BNP projeta alta de 0,5% este ano e 1% em 2013. Isso deve elevar o desemprego para 10,6%.
Ontem foi dia de queda das bolsas e a França era um dos motivos, mas não o único. O mundo está mais pessimista e o dia foi de somar preocupações. Na Holanda, o primeiro-ministro não teve consenso para as medidas de austeridade e renunciou. O PMI da Zona do Euro - índice das intenções de compra dos gerentes das empresas, que antecipa a atividade industrial - mostrou contração. Da China vieram números da produção industrial que dividiram opinião no mercado: alguns analistas acham que não foram tão ruins, outros lembram que não mostram retomada do crescimento. O PIB da Espanha fechou no negativo o primeiro trimestre do ano, levando o país à recessão. A França também divulgou números negativos na indústria, mostrando que está se confirmando o cenário de estagnação. A incerteza no país ainda permanecerá por algum tempo, e se Hollande ganhar haverá uma dose a mais de dúvida até que se saiba como afinal ele governará. Todas essas notícias ruins somadas, as bolsas caíram.
É nesse contexto que acontecem as eleições francesas, que têm roteiro de romance de suspense. Tudo começou com a prisão de Dominique Strauss-Khan, do Partido Socialista, por acusação de estupro de uma camareira em Nova York, quando ele liderava as pesquisas com 60% das intenções de voto. As duas próximas semanas serão emocionantes na França.
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