quinta-feira, março 08, 2012

O peso da concorrência desleal - EUGÊNIO DELIBERATO


O Estado de S.Paulo - 08/03/12


Os dados da indústria de pneumáticos mostram que o setor terminou 2011 com uma queda de 0,5% na produção, na comparação com o ano anterior. Além da óbvia explicação sobre a queda das exportações por causa da crise em países compradores dos pneus produzidos no Brasil, há um outro fator que tem peso ainda maior neste resultado: a concorrência desleal dos produtos asiáticos importados.

O Brasil tem hoje 15 fábricas de pneus, com uma produção de 66,9 milhões de unidades em 2011. O setor emprega diretamente mais de 25 mil profissionais, além de 100 mil indiretos. Só em tecnologia, essas empresas investiram mais de R$ 4 bilhões no Brasil nos últimos cinco anos. Além disso, o setor tem os melhores salários médios da indústria de transformação brasileira, de acordo com o IBGE.

Em 1999, com o Programa Nacional de Coleta e Destinação de Pneus Inservíveis, as empresas começaram a se organizar e investir para que hoje o setor tenha um bem-sucedido programa de pós-consumo, a Reciclanip, que tem servido de exemplo para setores que agora precisam cumprir a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Mais de US$ 159 milhões já foram investidos no programa, desde 1999, quando começou a coleta pelos fabricantes. Para este ano, o investimento previsto é de US$ 41 milhões. Mais de 1,86 milhão de toneladas de pneus inservíveis foram coletadas e destinadas adequadamente, o equivalente a 373 milhões de pneus de passeio, numa complexa operação logística que envolve 726 pontos de coleta e pelo menos 60 caminhões por dia, transportando pneus de pontos de coleta para os destinos de reutilização, nos sete dias da semana, 24 horas por dia.

Todos esses fatores são responsáveis por uma equação que resulta numa indústria equilibrada e saudável, mas que pode, no entanto, sofrer um significativo abalo com a concorrência injusta dos produtos asiáticos. Cerca de 40% do mercado nacional de pneus já é dos produtos asiáticos, que chegam no Brasil com preço abaixo do normal, uma vez que os pneus de lá não têm o custo de todos esses benefícios citados acima.

Um exemplo: o último Relatório de Pneumáticos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que apresenta os dados de coleta e destinação de pneus inservíveis no Brasil de outubro de 2009 a dezembro de 2010, revelou que os fabricantes nacionais cumpriram sua meta, inclusive ultrapassando um pouco a quantidade que por obrigação deveriam coletar no período. Esse documento revelou, no entanto, uma situação com a qual devemos nos preocupar como sociedade: os importadores de pneus, sujeitos às mesmas regras de sustentabilidade que os fabricantes nacionais, não estão cumprindo sua obrigação.

Os dados de queda da produção nacional de pneumáticos em 2011, num período de crescimento interno, já são um sinal evidente de que algo precisa ser feito. Reconhecendo a concorrência desleal, o governo brasileiro chegou a instituir, em 2009, taxa antidumping para pneus chineses. Foi uma decisão importante, mas com efeito de curta duração, pois nos meses seguintes foi registrado um grande crescimento na entrada de importados de outros países asiáticos, também com preços desleais e abaixo do mercado. Desde então, a fatia de mercado dos importados asiáticos só tem crescido.

O que está ocorrendo no setor de pneus pode ter consequências ruins para a sociedade, com perda de postos de trabalho, de remuneração e diminuição do investimento em tecnologia. É importante deixar claro que o setor de pneumáticos não quer reserva de mercado e considera a competição justa muito bem-vinda e saudável para o desenvolvimento da indústria nacional. O fator que está desequilibrando a equação e afetando as empresas que produzem aqui é a competição em condições desiguais. Intervir no assunto e tomar uma decisão não é uma questão protecionista. É tão somente uma questão de comércio justo.

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