O GLOBO - 03/12/11
É comum afirmar-se que antes de existir povo no Brasil já havia o Estado. Pode ser um exagero, mas, se considerarmos o Brasil moderno aquele fundado a partir da chegada de Dom João VI, em 1808, ele surgiu sob a sombra da presença física da corte portuguesa e levou dela para a República a marca do convívio da sociedade com um poder forte e acima dela.
Indiscutível é que o Estado penetrou na vida da nação de tal forma que, se não houver atenção por parte da sociedade civil, cristalizam- se mecanismos de tutela do cidadão pela burocracia pública.
Iniciado nesta semana, o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), de uma ação de declaração de inconstitucionalidade (Adin) proposta pelo PTB, em 2001, contra parte do Estatuto da Criança e do Adolescente (Eca), pode significar grande avanço na defesa das liberdades individuais, essência de qualquer regime democrático que faça jus ao nome.
Tendo como parte integrante a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), a ação questiona a constitucionalidade de tentativas do poder público de, com base no ECA, punir emissoras que se recusam a aceitar como compulsórias as indicações de faixas etárias da programação feitas pelo Ministério da Justiça.
O voto do relator, ministro José Antonio Toffoli, é positivo. Ele foi ao ponto ao considerar tal prática uma “restrição à liberdade” das emissoras de montar as grades de programação. Não pode deixar de ser informado para que idade o programa é indicado. Mas querer impor horários de exibição é censura prévia, significa incorrer no dispositivo constitucional de liberdade de expressão.
No voto, o ministro propõe que se deixe o povo, os pais, os cidadãos decidir o que os filhos podem ouvir e assistir. Este é o x da questão. Embora por pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa o julgamento tenha sido suspenso, nos debates na sessão em que Toffoli apresentou o voto, os magistrados Luiz Fux, Cármen Lúcia e Carlos Ayres Britto fizeram comentários favoráveis à argumentação do relator.
— Proteger a família em que medida? Substituindo a família? Decidindo por ela? O Estado não foi autorizado a tutelar ninguém, sobretudo no plano ético — resumiu Ayres Britto.
O perigoso é que a infiltração do Estado na esfera privada da sociedade ocorre de maneira capciosa, sempre em nome do “bem”, da defesa da população, quando, na verdade, sufoca o livre arbítrio por meio da tutela.
Há vários outros exemplos. O da utilização do ECA para censurar rádios e TVs é um deles. O mesmo ocorre quando a Anvisa, agência do Ministério da Saúde, extrapola os limites legais e tenta vetar peças de publicidade de bebidas. Ou quando um burocrata suspende a venda de bebidas alcoólicas em postos de reabastecimento e restaurantes de estrada, em vez de coibir o uso do álcool por meio da fiscalização, como faz com sucesso a Lei Seca. Ou querer impor um layout para farmácias.
Devido ao figurino ideológico das forças políticas que chegaram a Brasília em 2003, o Estado “protetor” tem ganhado força. Assim, infantiliza-se a sociedade, considerada incapaz de sobreviver sem a tutela de cima. E sufoca- se qualquer iniciativa de organização social autônoma, ao largo de Brasília.
Indiscutível é que o Estado penetrou na vida da nação de tal forma que, se não houver atenção por parte da sociedade civil, cristalizam- se mecanismos de tutela do cidadão pela burocracia pública.
Iniciado nesta semana, o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), de uma ação de declaração de inconstitucionalidade (Adin) proposta pelo PTB, em 2001, contra parte do Estatuto da Criança e do Adolescente (Eca), pode significar grande avanço na defesa das liberdades individuais, essência de qualquer regime democrático que faça jus ao nome.
Tendo como parte integrante a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), a ação questiona a constitucionalidade de tentativas do poder público de, com base no ECA, punir emissoras que se recusam a aceitar como compulsórias as indicações de faixas etárias da programação feitas pelo Ministério da Justiça.
O voto do relator, ministro José Antonio Toffoli, é positivo. Ele foi ao ponto ao considerar tal prática uma “restrição à liberdade” das emissoras de montar as grades de programação. Não pode deixar de ser informado para que idade o programa é indicado. Mas querer impor horários de exibição é censura prévia, significa incorrer no dispositivo constitucional de liberdade de expressão.
No voto, o ministro propõe que se deixe o povo, os pais, os cidadãos decidir o que os filhos podem ouvir e assistir. Este é o x da questão. Embora por pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa o julgamento tenha sido suspenso, nos debates na sessão em que Toffoli apresentou o voto, os magistrados Luiz Fux, Cármen Lúcia e Carlos Ayres Britto fizeram comentários favoráveis à argumentação do relator.
— Proteger a família em que medida? Substituindo a família? Decidindo por ela? O Estado não foi autorizado a tutelar ninguém, sobretudo no plano ético — resumiu Ayres Britto.
O perigoso é que a infiltração do Estado na esfera privada da sociedade ocorre de maneira capciosa, sempre em nome do “bem”, da defesa da população, quando, na verdade, sufoca o livre arbítrio por meio da tutela.
Há vários outros exemplos. O da utilização do ECA para censurar rádios e TVs é um deles. O mesmo ocorre quando a Anvisa, agência do Ministério da Saúde, extrapola os limites legais e tenta vetar peças de publicidade de bebidas. Ou quando um burocrata suspende a venda de bebidas alcoólicas em postos de reabastecimento e restaurantes de estrada, em vez de coibir o uso do álcool por meio da fiscalização, como faz com sucesso a Lei Seca. Ou querer impor um layout para farmácias.
Devido ao figurino ideológico das forças políticas que chegaram a Brasília em 2003, o Estado “protetor” tem ganhado força. Assim, infantiliza-se a sociedade, considerada incapaz de sobreviver sem a tutela de cima. E sufoca- se qualquer iniciativa de organização social autônoma, ao largo de Brasília.
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