sexta-feira, dezembro 23, 2011
Dilma dá um nó na base - DENISE ROTHENBURG
Correio Braziliense - 23/12/2011
Deixar o Orçamento para depois prejudica apenas os próprios parlamentares, que perdem o poder de pedir as emendas individuais no ano eleitoral. Por isso, Dilma não se abalou. Ontem estava mais preocupada com as favelas e o incêndio em São Paulo
O leitor atento deve ter notado que, nos últimos dias, o Congresso se dedicou à discussão do Orçamento sem que o governo tivesse muita pressa, fosse para aprovar a programação de 2012, ou os créditos pendentes de 2011. E se alguém tem culpa dessa letargia do Poder Executivo para aprovar o Orçamento, é a própria base governista, que levou um chapéu da presidente Dilma Rousseff no início do ano sem perceber.
No primeiro semestre, quando os parlamentares votaram a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), abriram várias brechas para que a presidente Dilma possa gastar um 12 avos dos recursos de investimentos caso o Orçamento não fosse aprovado dentro do prazo. É dinheiro para saúde, para merenda escolar, para transporte escolar, para bolsas de estudo, prevenção de catástrofes e mais uma penca, num total de 63 itens. Fora isso, ainda tem um volume global de restos a pagar, que pode ficar na casa dos R$ 40 bilhões — grande parte disso relativo a obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Fala sério, com tudo isso disponível o governo precisa aprovar o Orçamento e ceder agora os aumentos para quê?
Talvez alguém diga que é um sinal importante aprovar o Orçamento dentro do prazo, porque, afinal, não aprová-lo pode demonstrar fraqueza do governo no Congresso. Para se contrapor a essa leitura, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, fez ontem o balanço da economia, apontando perspectivas de um futuro melhor em 2012. Foi jogo combinado no Planalto colocar Mantega para fazer esse balanço justamente no último dia de funcionamento do Congresso, onde o Orçamento balançou o dia inteiro.
Por falar em balanço...
A presidente Dilma Rousseff ontem não estava nem um pouco preocupada com a perspectiva de o Orçamento ficar para 2012. O cálculo é matemático: do total de empenhos — verbas separadas para gastar num determinado projeto — até 14 de dezembro, havia R$ 37 bilhões de investimentos, dos quais apenas R$ 12,7 bilhões tinham sido pagos. Se pegarmos ainda os R$ 9,1 bilhões repassados em limites para gastos dos ministérios e que o governo pretende empenhar até o dia 31, seguramente o Poder Executivo terá algo em torno de R$ 40 bilhões. Esses recursos, na prática, serão empenhados agora, mas só serão gastos em 2012.
Por isso, a aprovação do Orçamento virou apenas um detalhe, que pode ser resolvido mais à frente com vantagens. A principal delas é retardar a pressão pelas emendas dos deputados e senadores em 2012. Para um governo que não quer gastar por conta da crise internacional e projeta quase um PAC de restos a pagar, deixar o Orçamento para depois não seria o fim do mundo.
Os 12 créditos orçamentários que o Congresso votou a toque de caixa tampouco preocupavam o governo. Com uma sutil diferença: eram necessários para fechar o Orçamento de 2011. Se não fossem votados, viria uma medida provisória bilionária, um "Jumbão" de recursos para várias áreas, capaz de fazer valer o que o Executivo pediu de urgente e o Congresso não dera. A Eletrobras, por exemplo, queria um crédito de R$ 1 bilhão para empresas vinculadas. A proposta saiu do gabinete da ministra Miriam Belchior em 15 de setembro. Chegou ao Parlamento em 17 de outubro. Em 8 de novembro, o deputado José Airton Cirilo (PT-CE) desistiu da relatoria. Há dois dias, a proposta seguiu da Comissão Mista de Orçamento para ser incluída na pauta do Congresso com um lembrete "dependendo de parecer a ser proferido em plenário". Ou seja, as excelências simplesmente não fizeram o dever de casa.
Por falar em dever...
O que tirou o sossego da presidente Dilma ontem foi o incêndio na favela em São Paulo, às vésperas do Natal, e a perspectiva de greve dos aeroviários. No caso da ameaça de greve, quem esteve com a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, me contou que, de seu computador, ela monitorava o movimento do saguão de cada um dos mais importantes do país. Em relação ao incêndio na Favela do Moinho, Dilma mandou três ministros para verificarem de perto a tragédia.
Quanto ao orçamento e aos pedidos de verbas da base aliada para aprovar a proposta, apenas a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, cuidou do tema. A ordem era, se não votasse a lei orçamentária, tudo bem. Os políticos, acostumados a governos que cedem aos seus caprichos, ficaram boquiabertos com a tranquilidade palaciana. Ontem, Dilma, realmente, deu um nó na base. Depois, dizem que ela não entende de política...
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