sexta-feira, outubro 14, 2011

ROBERT J. SAMUELSON - Não é fácil ser rico


Não é fácil ser rico
ROBERT J. SAMUELSON
O Estado de S. Paulo - 14/10/2011

Nos momentos de crise, como pela qual passamos, desigualdades gritantes que um dia pareciam toleráveis tornam-se ofensivas

O contexto do movimento Ocupem Wall Street e de propostas de taxação dos ricos- sendo "ricos" uma expressão constantemente redefinida - é a questão maior da desigualdade econômica.

Durante anos, políticos, acadêmicos e eruditos liberais reclamaram da desigualdade crescente,mas seus protestos praticamente não chegavam ao grande público. Quando a maioria das pessoas está se saindo bem, o fato de que algumas pessoas estão se saindo melhor não provoca muita ira. Não mais. Quando muitas pessoas se saem pior, ou temem piorar, os ricos inspiram ressentimento e inveja. Desigualdades gritantes que um dia pareciam toleráveis tornam-se ofensivas.

Em geral, os americanos encaram os ricos como encaram os pobres. Eles são "merecedores" e "não merecedores".

As tecnologias pioneiras merecedoras, administrar empresas vibrantes ou exceder em algo (advocacia, entretenimento, esportes). Poucos se ressentem da riqueza de Bill Gates ou de Oprah Winfrey.Ao contrário,os ricos"não merecedores" são bem-sucedidos por meio de "self-dealing" (uso de recursos alheios em proveito próprio por administradores de empresas) ou atividades carentes de um valor social amplo.

Oque está havendo agora é que mais ricos estão sendo desprezados como "não merecedores". Responsabilizados pela crise financeira, os tipos de Wall Street encabeçam a lista. Durante o boom do mercado acionário dos anos 1990, cerca da metade dos americanos concordava em que "o pessoal de Wall Street era tão honesto e ético como qualquer pessoa", reporta a Harris Poll.Neste ano, somente 26% pensam assim.

Dois terços acreditam que as pessoas mais bem-sucedidas de Wall Street ganham demais.Os presidentes executivos de corporações provocam uma ira parecida.

Com o desemprego em 9% e os salários estagnados, aumentos na remuneração de CEOs têm um ranço de compadrio de diretores submissos. Quando a Hewlett-Packard recentemente demitiu o presidente executivo Leo Apotheker após 11 meses com um pacote de rescisão de US$ 13 milhões, o descompasso entre remuneração e desempenho foi particularmente espantoso.

Além desses bodes expiatórios familiares, o que podemos dizer sobre a crescente desigualdade econômica? Apresentamos em seguida três generalizações.

Primeiro, o aumento tem sido espantoso.

De1945 ao fim dos anos 70, os10% mais ricos dos americanos detinham cerca de 33% a 35% da renda total, incluindo ganhos de capital (principalmente lucros com ações), segundo estimamos economistas Emmanuel Saez e ThomasPiketty.Em2007, sua parte era de 50% - equivalente ao fim dos anos 1920. Boa parte do ganho foi para o 1% mais rico, cuja participação aumentou de 10% em 1980 para 24% em 2007.

Segundo, é um fenômeno global. Em um estudo de 2008, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico( OCDE)revelou que a desigualdade havia aumentado em 17 de 22 países em duas décadas, embora as condições variem dramaticamente de um país para outro.Na Suécia e na Dinamarca, os 10% mais ricos têm rendas cerca de cinco vezes maiores que as dos 10% mais pobres.Nos Estados Unidos,a relação é 14-1. A média da OCDE é 9-1. O México tem a mais alta, 27-1.

Finalmente, a maioria dos ricos americanos - por qualquer definição - não escapam da tributação. Em 2007, os 10% mais ricos pagaram 55% de todos os imposto federais, estima o Escritório de Orçamento do Congresso. O 1% mais rico pagou a parte do leão disso: 18,1% dos impostos federais. A alíquota fiscal média dos 1% mais ricos foi de 29,5%. Além disso, os3%mais ricos respondem por 36% das contribuições de caridade.

Seja qual for a causa, a desigualdade é uma nova linha divisória política. Apenas na semana passada, o líder da maioria no Senado, Harry Reid, democrata de Nevada, propôs uma sobretaxa de 5,6% para os que ganham mais de US$ 1 milhão para financiar o programa de criação de empregos de US$447 bilhões do presidente Obama. O que poderia ser mais fácil?Os milionários são numericamente poucos (cerca de 534 mil, segundo o Centro de Política Fiscal). Eles são cada vez mais impopulares, e podem arcar com isso.

O problema é que os ricos não se encaixam nos estereótipos: eles não são todos CEOs paparicados, banqueiros de investimento espertalhões, popstars e atletas.Muitos possuem pequenas e médias empresas.

Metade da riqueza do 1% mais rico consiste de participações nessas empresas.

Isso dobra suas posses de ações,bônus e fundos mútuos,segundo números compilados pelo economista Edward WolffdaUniversidade de Nova York.

Reid financiaria o plano de criação de empregos de Obama taxando as pessoas que supostamente criam empregos.

E isso faz sentido? A reação adversa contra os ricos é o começo do debate, não o fim. Será que os ricos devem ser punidos pelos seu sucesso o um era mente solicitados apagar sua "justa" cota? Quem é rico ou quem está apenas bem de vida? Será que US$ 250 mil é uma marca razoável para casais, como Obama certa vez sugeriu,ou será que isso foi repudiado? Se os impostos subirem, que abordagem preservaria melhor os incentivos para se trabalhar duro, investir e correr riscos? Os ataques de Obama à líderes empresariais ricos serão apenas vazios ou jogadas políticas baratas? Medidos por qualquer parâmetro, os ricos estão sitiados; e os ataques quase certamente se intensificarão.

/ TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK

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