Algumas despesas podem estar subestimadas
RIBAMAR OLIVEIRA
VALOR ECONÔMICO - 06/10/11
Há fortes indícios de que algumas das principais despesas da União podem estar subestimadas na proposta orçamentária para 2012. Uma análise mais detida da proposta mostra que o governo trabalha com uma queda real (descontada a inflação) das despesas com pessoal e encargos sociais, o que há muito tempo não ocorre.
As previsões de gastos com benefícios previdenciários e assistenciais para 2012 foram feitas pelo governo com base em um aumento de 13,62% para o salário mínimo a ser pago a partir de 1º de janeiro, levando em conta um INPC neste ano de 5,69% e o crescimento da economia em 2010 de 7,5%. A regra do reajuste do mínimo prevê uma correção pelo INPC do ano mais o aumento real do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos anteriores. Em 2010, o PIB cresceu 7,5%.
O mais provável, no entanto, é que o índice de reajuste fique próximo a 14,5%, pois o INPC talvez atinja 6,5%, se a última projeção de inflação do Banco Central para 2011 estiver correta. Para cada R$ 1 de aumento do salário mínimo, a equipe econômica estima uma elevação das despesas previdenciárias e assistenciais em R$ 306 milhões.
Se for levado em conta o mínimo de R$ 619,21 projetado pelo governo, as despesas com benefícios previdenciários e assistenciais deverão crescer R$ 22,7 bilhões em 2012 - valor que está na proposta orçamentária. Se o mínimo ficar em R$ 624 (com reajuste de 14,5%), o gasto adicional seria de R$ 24,2 bilhões. Essas despesas estariam subestimadas, portanto, em R$ 1,5 bilhão.
É razoável pensar que o impacto do aumento do salário mínimo nas despesas previdenciárias e assistenciais seja maior, atualmente, que os R$ 306 milhões para cada R$ 1, estimados inicialmente. Isto porque os gastos com benefícios previdenciários e com abono salarial e seguro desemprego cresceram muito em 2011.
De acordo com o relatório de avaliação de receitas e despesas relativo ao 4º bimestre, as despesas deste ano com benefícios previdenciários subiram R$ 5,5 bilhões em comparação ao inicialmente previsto, enquanto os gastos com o abono salarial e o seguro desemprego aumentaram R$ 5 bilhões. As elevações desses gastos só foram conhecidas depois que o governo encaminhou a proposta orçamentária de 2012 ao Congresso, em agosto. Isto significa que a base para a projeção dessas despesas no próximo ano aumentou. Seria interessante que a área econômica estimasse o novo impacto do aumento do mínimo nas contas da União.
A outra despesa orçamentária importante é o pagamento do funcionalismo público federal. A proposta orçamentária prevê um aumento de R$ 7,6 bilhões nesses gastos em 2012, em comparação com este ano. Nesse total, estão computados despesas de R$ 1,8 bilhão por conta de reajustes e reestruturações de carreiras realizadas em 2011 e R$ 1 bilhão decorrente de admissões de servidores este ano.
Para as reestruturações de carreiras que serão feitas em 2012 - e que atingirão 937,7 mil servidores, sendo 546,9 mil ativos e 390,8 mil inativos - o governo destinou R$ 1,5 bilhão. Há previsão ainda, no próximo ano, de R$ 1,6 bilhão para concursos e preenchimento de cargos no Poder Executivo e de R$ 504 milhões no Legislativo, Judiciário e Ministério Público da União (MPU).
Mas não há previsão de reajuste salarial para os servidores do Judiciário, do Legislativo ou do MPU. Não há sequer previsão para o reajuste do teto da remuneração do funcionalismo, que é o subsídio de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e que regula os vencimentos de toda a magistratura do país. Mesmo no caso do Executivo, não foi contemplado qualquer tipo de correção para os servidores da Polícia Federal, da Receita Federal e do Tesouro Nacional.
A dúvida que persiste é se o governo Dilma Rousseff terá condições políticas de manter esse controle dos gastos com o pagamento do funcionalismo no nível que consta na proposta orçamentária. As diversas categorias de servidores já estão em mobilização salarial, estimuladas pela corrosão da elevada inflação sobre o seu poder aquisitivo.
Essa análise sobre as despesas é importante para saber se o governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) terá condições de obter o superávit primário de R$ 97 bilhões no ano que vem, sem o desconto dos investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). É bom lembrar que a proposta orçamentária foi elaborada com um superávit de apenas R$ 71,4 bilhões, pois foram descontados R$ 25,6 bilhões do PAC.
Se duas das principais despesas estiverem subestimadas, como parece que estão, as dificuldades para obter a "meta cheia" de superávit, sem o desconto do PAC, serão ainda maiores. O contingenciamento de fevereiro terá que ser mais forte. Mesmo porque, como foi lembrado nesta coluna na semana passada, a receita da União projetada na proposta orçamentária para 2012 já inclui uma receita extraordinária de R$ 18 bilhões, mais ou menos aquela que será obtida este ano. As receitas extraordinárias são aquelas decorrentes de decisões judiciais, antecipações de pagamento de tributos etc. Ou seja, não haverá margem para aumentar essas receitas e resolver o problema orçamentário.
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