Beijos
LUIZ FERNANDO VERISSIMO
O GLOBO - 25/09/11
Para simplificar, passou a beijar todas. Conhecidas ou não. Quando lhe apresentavam uma mulher, em vez de apertar sua mão, beijava-a. Dois beijos, um em cada face.
– Muito (muá) prazer (muá).
– Beijo todas.
– Quantas vezes?
– Quem está contando?
Às vezes, ele partia para o terceiro beijo e a beijada não esperava. Ou então esperava e ele não dava, e quando ele voltava ela já recuara. Não havia nada mais constrangedor do que oferecer a face para o terceiro beijo (ou o quarto, quando a moda passou a ser esta) e o beijo não vir. Ficar, por assim dizer, com a cara no ar enquanto a mulher se afastava, rezando para que ninguém tivesse notado. O problema da vida, pensava ele, é que a vida não é coreografada.
Aí os homens começaram a se beijar também. Tudo bem. Seu lema passou a ser: se me beijarem, eu beijo. Mas não tomava a iniciativa. Quando chegavam numa reunião, fazia um rápido levantamento dos presentes. Essa eu beijo duas vezes, essa três, esse me beija, esse não me beija, aquele já está me beijando quatro vezes...
Na outra noite, numa
recepção de casamento, a mulher comentou:
– Você enlouqueceu?
– Me descontrolei, pronto.
– Você beijou todo o mundo.
– Todo o mundo estava beijando todo o mundo.
– Mas beijo na boca?
– Foi só um.
– Mas logo o padre?!
Tomado por uma espécie de frenesi, depois de beijar uma fileira de conhecidos e desconhecidos, ele dobrara o padre pela cintura e o beijara longamente, como no cinema antigo.
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