DIGA NÃO À CORRUPÇÃO
O debate da Educação
JOÃO CARLOS DI GENIO
O GLOBO - 07/09/11
As deficiências do sistema educacional brasileiro como um todo são notórias e sempre confirmadas pelos indicadores nacionais e internacionais. Uma primeira diferença significativa em relação ao Chile está em que nossos resultados não se têm mostrado estagnados, como os de lá, mas apresentam melhora - ainda que intoleravelmente menor que a melhora de que precisamos (lembre-se, porém, que melhoras na educação dependem de processos de longa duração, cujos resultados significativos não se colhem em menos de uma geração). E, se temos melhorado, ainda que pouco, isso se deve a uma situação que, em aspectos fundamentais, não tem semelhança com a chilena.
É notório que uma das reivindicações centrais do movimento dos estudantes chilenos é a regulação, ou seja, regulamentação e controle do sistema escolar, cuja anomia é ressaltada no artigo de Magnoli. Ora, se alguma crítica se pode fazer ao sistema educacional brasileiro, quanto a isto, é de pecar pelo oposto. Tradicionalmente não nos faltam normas - normas concernentes aos mais diversos aspectos do sistema educacional - e ultimamente elas só têm aumentado. Mais importante: os sistemas de fiscalização e aferição tornaram-se muito mais abrangentes e exigentes, num processo de ampliação e rigor crescente que remonta à criação de sistemas nacionais de avaliação, como o Ideb, para o ensino básico, o Enem, para o ensino médio, e o Enade, para o ensino superior.
Outro ponto em que os fatos contrariam afirmações contidas no artigo diz respeito ao destino que estariam tendo os bolsistas do ProUni, condenados a "preencher vagas ociosas nas piores universidades privadas". Primeiro, não se trata de "vagas ociosas", mas de vagas como quaisquer outras, concedidas a bolsistas. Depois, não se trata das "piores universidades privadas", mas das universidades privadas em geral, sendo que as piores, em razão de seu resultado deficiente no Enade, são descredenciadas do ProUni.
Ainda no que se refere ao ProUni, acrescento dois dados ausentes do artigo de Magnoli que ajudam a compor um quadro mais verdadeiro da situação, que diverge significativamente da do Chile: o ProUni inclui hoje nas escolas superiores brasileiras 502 mil estudantes. Avalie-se o que isto representa, levando-se em conta que há cerca de 800 mil matrículas nas universidades federais. Outro dado eloquente é que o custo médio anual de um aluno nas universidades federais é de R$15.000, enquanto o de um aluno do ProUni nas instituições privadas, em termos de renúncia fiscal, é de R$2.100.
Para além dessas inexatidões e omissões, porém, o artigo de Magnoli exprime uma visão da educação que, paradoxalmente neste crítico contumaz da esquerda, remonta a um esquerdismo histórico que os fatos insistem em desaconselhar. Refiro-me à oposição entre escola pública e escola privada, como se houvesse incompatibilidades inconciliáveis e o sucesso da segunda dependesse de deficiências da primeira. Não é a situação que vemos nos países mais bem-sucedidos na área educacional, em que um sistema público amplo rivaliza com o privado e mesmo o supera em qualidade, com ele convivendo sem incompatibilidade, mas com a complementaridade adequada a sociedades abertas e plurais. É o modelo que devemos almejar para o Brasil, com sistemas público e privado de ensino que ocupem os espaços devidos na sociedade e mutuamente se reforcem em prol do desenvolvimento intelectual e material do país.
JOÃO CARLOS DI GENIO é empresário e professor.
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