Começo, meio e fim
ALON FEUERWERKER
CORREIO BRAZILIENSE - 28/09/11
Se fosse prioridade mesmo, o governo federal entraria no debate da saúde com um diagnóstico sobre: 1) o que precisa ser feito; 2) em quanto tempo dá para fazer; 3) quanto custa; 4) como arrumar o dinheiro
Infelizmente para o Sistema Único de Saúde (SUS), o debate sobre a regulamentação da Emenda Constitucional 29 (que também vincula a verba do setor ao crescimento nominal do Produto Interno Bruto) corre, por enquanto, pelas raias da propaganda e da esperteza.
Todo mundo quer tirar uma casquinha.
Quando " e se " finalmente concluir a votação, o Congresso Nacional posará de benfeitor. Já o governo federal está à espreita, vendo se abre a janela de oportunidade para emplacar um novo imposto.
Em qualquer caso a votação trará algum ganho social. As autoridades enfrentarão mais dificuldades para classificar como "para a saúde" verbas que hoje desviam rumo a outras finalidades.
Mas aí virá o problema: como financiar doravante o que até então recebia indevidamente verbas da saúde?
É legítimo suspeitar que o tal novo imposto não seria para suprir a saúde, mas para tapar buracos provocados pela maior rigidez das regras sobre a aplicação do dinheiro.
A não ser, naturalmente, que o governo federal se comprometa a colocar na saúde tudo que coloca hoje, e mais o dinheiro do novo imposto.
Difícil acreditar.
A saúde é prioridade em qualquer pesquisa com o público, mas não recebe das autoridades o olhar merecido. Parecem estar mais preocupadas com o eventual desgaste de aparecerem como nem aí para o problema.
Se fosse prioridade mesmo, o governo federal entraria no debate com um diagnóstico sobre: 1) o que precisa ser feito; 2) em quanto tempo dá para fazer; 3) quanto custa; 4) como levantar o dinheiro.
Uma explicação com começo, meio e fim.
Será uma pena se toda a energia investida na discussão, na sociedade e no parlamento, acabar desperdiçada. Ou se a montanha der à luz um ratinho. Se o governo reconhece a dimensão da encrenca, cabe-lhe dizer como sair dela.
Ou então continuará correndo atrás dos acontecimentos. E argumentando que a necessidade de finanças públicas austeras impede oferecer à saúde o necessário para ela funcionar bem.
Um argumento que vale também para a educação. Vale aliás para quase qualquer coisa. Em outros tempos, a tese de colocar as finanças públicas acima do bem e do mal seria acusada de socialmente insensível e " por que não? " "neoliberal".
Escasseiam hoje os políticos dispostos a ir por essa retórica. Mas os políticos não são impermeáveis à percepção generalizada de que só falta mesmo dinheiro é para as coisas que atendem às demandas da maioria. Como por exemplo a saúde.
Esse é o ambiente em que o Senado vai apreciar a proposta minimalista vinda da Câmara dos Deputados. O risco sabido é os senadores reafirmarem o maximalismo que enviaram aos deputados, quando aprovaram o texto do então senador Tião Viana.
Que propõe dar à Saúde 10% das receitas correntes da União.
A oposição certamente lembrará, com lógica, que a proposta é de um ex-senador petista, hoje governador do Acre pelo PT. Defenderá que Mateus seja embalado por quem o trouxe ao mundo.
O governo tem como evitar a derrota. Mas se ela vier sempre será possível à presidente vetar, pois a legislação proposta é infraconstitucional.
O debate do momento no Congresso é sobre a divisão dos royalties do pré-sal. Deputados e senadores ameaçam derrubar o veto do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O governo movimenta-se para evitar.
Se derrubar mesmo o veto aos royalties, o Parlamento terá mandado um recado para Dilma Rousseff. E a porteira estará aberta. Derrubado o primeiro, ficará mais fácil ameaçar com a derrubada do segundo.
A opinião pública bradará contra a irresponsabilidade nos gastos públicos, mas talvez não seja suficiente. O povo, como se sabe, leva em conta apenas parcialmente os conselhos dos chamados formadores de opinião.
Talvez seja melhor o governo se mexer e aparecer com soluções. E não só lançar advertências.
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