terça-feira, agosto 09, 2011

LUIZ GARCIA - Supremo e Superior


Supremo e Superior
LUIZ GARCIA
O Globo - 09/08/2011

Alguém já disse - e, se não disse, deveria ter dito - que o Brasil é um país que adora redundâncias: se uma coisa é boa e dá certo, repete-se a sua receita quantas vezes for possível. Até, claro, deixar de dar certo.

Uma aparente redundância existe na cúpula do Poder Judiciário, onde estão o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal. Para um observador ingênuo, "superior" já indicaria o fim da linha, o topo da pirâmide. Nada disso: pelo visto, era preciso mais um degrau - e ficou decidido que "supremo" estava acima de "superior". Talvez tenhamos de dar graças a Deus pela inexistência no vocabulário de um patamar depois de "supremo".

A instância "superior" é o fim da linha para questões que não têm a ver com a Constituição. E no patamar "supremo" julga-se a constitucionalidade das leis. O STF também é o tribunal para crimes de que sejam acusados os ocupantes de cargos no topo da pirâmide: presidentes e vice-presidentes da República, membros do Congresso etc.

Só para comparar, sem a pretensão de palpitar sobre qual é o melhor sistema, nos Estados Unidos o Supremo Tribunal só julga questões que, na opinião dos seus sete ministros, envolvem a interpretação da Constituição americana, que é muito menos detalhada que a nossa. O que talvez seja uma virtude. Ou, quem sabe, uma questão de temperamento: os anglo-saxões tendem a ser mais concisos que os latinos, alguma coisa por aí.

Seja como for, parece que o nosso sistema está com um sério problema: no ano passado, os ministros do STJ receberam perto de 230 mil processos. No fim do ano, mais de 190 mil deles aguardavam julgamento. Justiça adiada, como se sabe, é injustiça.

A situação levou o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, a propor uma medida dramática: dobrar o número de membros do STJ, de 33 para 66. Não sairia barato. Para se ter uma ideia, no ano passado o tribunal precisou de mais de R$700 milhões para a sua folha de pagamentos - uns cem milhões acima do que o STF pretende gastar em 2012. E é preciso não esquecer que, mesmo com o reforço de 33 ministros, o tribunal obviamente não conseguirá botar os julgamentos em dia.

Na verdade, o problema do Judiciário não é apenas financeiro: tem deficiências de estrutura e organização, que não serão sanadas simplesmente por injeção de recursos. Apenas por exemplo, talvez seja até necessário discutir se precisamos mesmo ter dois tribunais na última instância da Justiça. Afinal de contas, "Supremo" e "Superior" são sinônimos, ou quase isso.

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