A classe média ganha força
CELSO MING
O Estado de S.Paulo - 27/08/11
O tão esperado pronunciamento de Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), feito ontem em Jackson Hole, espalhou desapontamento pelos mercados. Ele não prometeu nenhuma novidade capaz de virar o jogo perdedor da economia americana. Apenas repetiu o que o último comunicado do Fed já apontara: caso seja necessário, colocará em marcha os mecanismos disponíveis.
Na verdade, é improvável haver mecanismos disponíveis fora ou dentro do Fed. O Tesouro americano, por exemplo, está paralisado pelo endividamento excessivo e a alta dos impostos parece difícil, numa paisagem em que o consumidor também está atolado em dívidas. Já o Fed está paralisado por não poder injetar ainda mais recursos nos mercados: os juros rastejarão, ao menos, até meados de 2013 e isso já indica enorme abundância de dinheiro na economia. Como não conseguem ou não querem correr o risco de elevar ainda mais o crédito, os bancos americanos estão guardando US$ 1,6 trilhão no próprio Fed. Ou seja, novas injeções de recursos na economia não acionariam nem o consumo nem o setor produtivo; tenderiam a parar no caixa dos bancos que, por sua vez, aumentariam suas reservas no Fed.
Como fica o Brasil ante a estagnação dos países ricos, portanto, ante sua baixa capacidade de importar? Dá para contar com as encomendas de alimentos e matérias-primas da China, se a própria China apoiou o crescimento de sua economia nas exportações para o Primeiro Mundo?
Ontem, no 5.º Congresso Internacional de Mercados Financeiro e de Capitais, realizado pela BM&FBovespa em Campos do Jordão, o ex-diretor do Banco Central e economista-chefe do Itaú Unibanco, Ilan Goldfajn, explicou que a China e outros emergentes tendem a desenvolver mais seu mercado interno do que a seguir voltados para as exportações. E isso pode indicar que as exportações brasileiras, fortemente voltadas para os asiáticos, não serão gravemente prejudicadas pela paradeira dos países ricos. Mas ele não descartou um cenário de ruptura da economia global que imponha um custo mais alto, também, para a economia brasileira. Isso aconteceria se sobreviesse um grave naufrágio bancário na Europa como o do Lehman Brothers, de 2008.
Bem mais otimista, o professor Marcelo Cortes Neri, da Fundação Getúlio Vargas, avisou que, desde 2003, nada menos que 50 milhões de emergentes - "mais do que uma Espanha" - foram incorporados ao mercado de consumo. Só no Brasil, 13,3 milhões de pessoas não só aumentaram seu poder aquisitivo, mas também melhoraram a qualidade de vida, com incremento da educação, acesso à informação e emprego com carteira de trabalho assinada. Para Neri, não é uma mudança episódica, mas, sim, uma virada consistente, que garante uma capacidade de resistência sólida dos emergentes à crise mundial.
Assim, o Brasil tem uma peculiaridade especial: ser o campeão da tabela de felicidade futura. Forte otimismo e alto grau de confiança permeiam a sociedade brasileira e ajudam a empurrar a economia.
Mas há um lado ruim. Difundem certa aversão às reformas e à necessidade de preparar a economia para os próximos anos. Pior: tendem a estimular demais o consumo e a desencorajar a poupança. Por isso, tendem a reduzir a capacidade de investimento que, em seguida, garantiria maior capacidade de crescimento econômico e de emprego.
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