São os derivativos que definem preço do dólar
EDUARDO CAMPOS
Valor Econômico - 06/07/2011
Não durou muito o silêncio do Ministério da Fazenda quanto ao recente comportamento da moeda brasileira.
Ontem, de Londres, o ministro Guido Mantega, mandou seu recado: o governo pode tomar medidas nos mercados de derivativos e futuros para conter a apreciação do real.
A ameaça de intervenção não causa surpresa, afinal de contas, todas as vezes que o real apresentou firme movimento de alta, o governo veio dar seus pitacos.
O que causou alguma estranheza desta vez é que a resposta não foi imediata, tendo em vista que o dólar veio sem parada de R$ 1,604 para R$ 1,553, menor preço desde 1999 em seis dias.
Na terça-feira, essa sequência de queda foi interrompida. O dólar comercial fechou em alta de 0,70%, a R$ 1,564. No mercado futuro, o dólar para agosto ganhava 0,83%, a R$ 1,574, antes do ajuste final de posições.
Mas esse movimento de valorização não pode ser atribuído exclusivamente à postura do ministro.
Além do claro espaço para um ajuste técnico, o dólar subiu de forma generalizada em função da piora de humor com relação ao financiamento da dívida grega, evento que se somou ao rebaixamento da nota soberana de Portugal pela agência de classificação de risco Moody's.
Ilustrando essa demanda por dólares, o Dollar Index, que mede o desempenho da divisa americana ante uma cesta de moedas, subiu 0,50% para 74,65 pontos.
Quanto à fala do ministro, o que chama atenção foi o recado mais direcionado, apontando para os "derivativos e futuros".
Parece que o governo pretende atacar a real fonte de apreciação da moeda brasileira e não mais tentar limitar o fluxo, que tem pouca relação com a valorização do real, tendo em vista que o Banco Central (BC) compra todo o excedente de dólares que entra no país e mais um pouco.
Os dados sobre fluxo cambial que serão apresentados hoje podem respaldar ainda mais essa avaliação. Salvo uma firme reversão de tendência, junho caminhava para ser o primeiro mês do ano com fluxo cambial negativo. E, mesmo assim, a moeda americana perdeu valor para o real.
Conforme já discutido nesse espaço, o viés de baixa na moeda tem grande relação com as posições no mercado futuro, onde os estrangeiros mantêm posição vendida (aquela que ganha com a queda do dólar) superior a US$ 23 bilhões.
Fora isso, os bancos locais, apesar de comprados no mercado futuro, têm quase US$ 14 bilhões vendidos no mercado à vista de câmbio. Cabe lembrar que não é possível saber qual a exposição líquida dos bancos, pois eles têm outras formas de atuar no mercado cambial.
Mas, se consideramos o expressivo aumento de endividamento externo tanto de bancos como de empresas nos últimos anos, há de se imaginar que esses agentes não tenham muito interesse em uma disparada na cotação da moeda americana. Todos lembram das empresas que tombaram depois da arrancada de preço do dólar durante a crise de 2008.
Outro importante vetor de baixa são as operações via NDF (non-deliverable forward, contrato a termo de moeda sem entrega física), que permitem a arbitragem de taxa de juros sem que o investidor saiba a cor de um cédula de real.
Há fatores fundamentais também e o principal deles é a taxa de juros, que oferece um rendimento que deixa o investidor estrangeiro salivando. Por isso, por mais que se criem dificuldades, os arbitradores sempre buscam formas de ganhar esse "dinheiro fácil" - daí a importância dos derivativos e das NDFs.
Outro ponto considerado em algumas análises são os ganhos nos termos de troca. O preço do que o país exportou nos últimos anos subiu muito mais do que o valor dos bens que importou. O que explica isso são as commodities, já que cerca de 70% das vendas externas brasileiras podem ser colocadas nessa categoria de produto.
Aqui a avaliação é um pouco mais complexa, pois mesmo que o preço das matérias-primas perca força, seja por menor crescimento da China ou outro motivo, o valor das importações ainda apresentaria viés de baixa, reflexo de um mundo desenvolvido que briga por demanda externa para tentar sair de um período de baixo crescimento no qual não pode contar com o próprio mercado doméstico, já que esse ainda está se desalavancando depois de anos de gastança e pouca previdência.
O cenário se embaraça ainda mais se levarmos em conta que a China pode desacelerar mas nem tanto, e que, caso os EUA não engatem recuperação, mais ajuda pode ser liberada. Algo que manteria o preço das commodities em patamar elevado.
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