"Lula e José Dirceu são solidários comigo"
Prefeito de Campinas, investigado pela Câmara e ameaçado de perder o mandato, ataca o PSDB e diz ter apoio de petistas
Fausto Macedo e Fernando Gallo
O Estado de S.Paulo - 17/06/11
ENTREVISTA - Dr. Hélio, Prefeito de Campinas (PDT)
Dr. Hélio vai ao ataque e seu alvo é o PSDB. "Estou sendo vítima de um linchamento político e moral, uma perseguição injusta de políticos do PSDB que pretendem antecipar a eleição do ano que vem."
Dr. Hélio mira o governo estadual, dos tucanos. "O que está explícito pelo Ministério Público é que houve uma contaminação em diversas entidades do governo do Estado de São Paulo. Sabesp, secretarias de Estado, da Educação e tantas outras secretarias. São mais de 300 contratos em mais de 11 municípios, com iguais problemas (suspeitas de corrupção)."
Dr. Hélio mostra suas armas e nomeia aliados do PT na grande batalha política contra o impeachment que o espreita. "O presidente Lula está comigo, ele passou por situação assemelhada. Tenho o reconhecimento da Dilma. O Zé (José Dirceu) me telefonou", disse.
No dia seguinte ao embate na Câmara - do qual saiu vitorioso porque superou opositores que pediam seu afastamento sumário -, Hélio de Oliveira Santos, o Dr. Hélio (PDT), prefeito de Campinas em segundo mandato, era um homem de semblante aliviado.
Às 12h15, ele recebeu o Estado, na companhia de seus advogados - Eduardo Carnelós, José Roberto Batochio e Alberto Mendonça Rollo, os dois primeiros especialistas em causas criminais e o terceiro, em Direito Eleitoral e Administrativo.
Durante 80 minutos, o prefeito falou sobre a intensa pressão que experimenta desde que a promotoria deu início a uma devassa sem precedentes em seu governo. Dr. Hélio não é citado na investigação, mas o Ministério Público imputa a sua mulher, Rosely Nassim, o papel de chefe de quadrilha para fraudes em licitações, corrupção e desvio de recursos públicos.
Das provas colhidas pela promotoria se valeu a oposição, que faz alarido na cidade de 1,3 milhão de habitantes e requer sua cassação. Na noite de quarta-feira, Dr. Hélio deu passo decisivo para rechaçar a ofensiva dos adversários. Por 16 votos a 15, os parlamentares aprovaram sua saída da Prefeitura até a conclusão dos trabalhos da comissão processante, manifestação insuficiente - era necessário que 2/3 da Casa impusessem a queda. Ao ser comunicado do triunfo, invocou Barack Obama. "Sim, nós podemos. Nós podemos virar o jogo."
A que atribui a investigação?
Quem abriu a comissão processante foi o PSDB. O mesmo PSDB que por duas vezes eu derrotei, nas eleições de 2004 e 2008, esta no primeiro turno. Os argumentos postos na comissão são eminentemente políticos. Assim como este último requerimento pelo meu afastamento, que é absolutamente inconstitucional. Foi tentado na Justiça e a Justiça considerou inconstitucional. Não há nenhum caso no Brasil em que se derruba outro poder através de requerimento postado pela Câmara, alguém que foi eleito democraticamente pelo povo. Em nenhum momento das provas que foram apresentadas pelo vereador do PSDB eu faço parte como participante.
Qual sua ligação com os contratos da Sanasa, companhia de saneamento que a promotoria aponta como núcleo de corrupção?
É voz corrente do próprio Ministério Público e do próprio magistrado (juiz Nelson Augusto Bernardes de Souza) e não tem nenhum grampo, nenhum fato que me ligue a essas ações. Essa comissão processante tem um intuito motivacional político e abre precedente perigoso porque coloca em cheque o Estado de Direito democrático que foi obtido com o voto da maioria dos campineiros.
Seu governo está sob suspeita.
Tem a questão moral, vindo de quem vem, do PSDB, o povo há de se recordar. Os precatórios judiciais de 1996, a famosa CPI dos Precatórios no Senado fez com que a cidade ficasse paralisada mais de 15 anos com uma dívida insuperável, R$ 79 milhões de precatórios irregulares. Parte disso acabou sendo usada para pagar empreiteiras e essa dívida se transformou em quase R$ 1 bilhão. Essa operação não só não pagou os precatórios como nos trouxe prejuízo inclusive junto ao Tribunal de Contas, como também originou uma dívida fundada que prejudicou a cidade. Na questão moral, o PSDB tem que fazer a sua própria reflexão.
Sua administração parou?
A cidade vive o trabalho, o cotidiano, em todos os bairros. O transporte funciona com qualidade, o asfalto, a macrodrenagem para evitar que a cidade sofresse com os agravos ambientais. A cidade continua prestando serviço de saúde pública em hospitais que eu trouxe através da parceria com o governo federal. Uma comissão processante para afastar o prefeito não tem base. Eu estou há sete anos no cargo, até hoje não sofri nenhuma suspeição levantada pelos órgãos públicos. E tenho minha vida pregressa. Fui duas vezes deputado federal. Tenho uma vida publica de 45 anos.
Como o sr. viu a votação na Câmara?
Recebo com muita tranquilidade. O Legislativo é autônomo, independente, nada mais justo do que passar por um processo quando ele é legítimo, previsto na Lei Orgânica do município. Os vereadores da base do governo estão se reorganizando. Os meus eleitores e aqueles que se convenceram do mérito da irregularidade, da inconstitucionalidade desse requerimento, votaram pela minha permanência. Acredito que até o final da comissão vão levar em conta o mérito e fazer Justiça a um prefeito que administra uma das cidades mais importantes desse País, que voltou a crescer, que recuperou aquelas vocações tradicionais e o desenvolvimento, atraindo empresas nacionais e internacionais.
Como o sr. foi envolvido?
Por um certo grau de oportunismo e má intenção. As investigações de contratos em licitações envolvem exclusivamente a Sanasa, uma economia mista, tem autonomia plena para decidir sobre obras, projetos, contratos. Tem conselho de administração, conselho fiscal, é auditada externamente por empresas, passa por auditoria de contas pelo Estado, empresa independente. É evidente que ela tem que estar integrada a algumas metas do governo. A minha principal era a que a cidade chegasse a um saneamento de 100%, hoje já atinge 90%. O meu papel como prefeitura é tratar diretriz, prioridades que devem ser respeitadas. Mas a Sanasa conta com administração própria.
O sr. nomeou Luiz Aquino para dirigir a Sanasa. Ele confessou crimes e delatou sua mulher.
Em 2008, época de campanha eleitoral, eu soube de boatos que indicavam irregularidades na empresa. Imediatamente chamei o Aquino e determinei uma sindicância. Ele pediu demissão. Eram boatos relativos a gravações, chantagens. O fato é que nenhuma prova, nenhum documento, nenhuma escuta, chegou diretamente ao meu conhecimento. Mas ouvia-se que adversários poderiam lançar mão destas gravações que mostravam irregularidades na relação do presidente da Sanasa com lobistas espertos. Chamei, perguntei se estava sofrendo chantagem, extorsão. Ele negava. Eu falei, vou fazer uma investigação, uma auditagem e seria bom que você se afastasse. Ele pediu demissão.
O ex-presidente da Sanasa citou o seu nome?
Nunca citou, nem por vingança nem por maldade. Mas aproveitou a delação premiada para envolver minha mulher. Nenhum outro ouvido pelo Ministério Público fez isso. O Aquino é uma pessoa competente, inteligente.
Isso ocorreu só na Sanasa?
O que está explicito pelo Ministério Público é que não. Houve uma contaminação dessa em diversas entidades do governo do Estado de São Paulo. Sabesp, secretarias de Estado, da Educação, e tantas outras secretarias. São mais de 300 contratos do governo do Estado, em mais de 11 municípios, apresentando iguais problemas. O curioso é que provas, por exemplo, na Sabesp, grampos telefônicos apresentados pelo próprio Gaeco (unidade do Ministério Público que investiga crime organizado) e que envolve secretários do governo do Estado com alguns empresários que foram presos em Campinas, nada disso foi utilizado. Não houve posicionamentos coercitivos como os que foram utilizados em Campinas. Fica evidente que está se trabalhando com dois pesos e duas medidas. Vemos várias entidades do governo do Estado, gravações e grampos relatando nomes de profissionais e autoridades, mas lá não apareceu nenhum espetáculo, camburões, e nenhum episódio de natureza coercitiva, com prisões preventivas, que evidentemente atentam contra o direito da presunção de inocência e o direito de defesa.
Considera culpados os integrantes do seu governo exonerados?
As pessoas são inocentes até provar o contrário. E até agora não há provas concretas contra nenhum deles. E eles não tiveram direito a defesa. É a palavra do sr. Aquino, réu confesso. O direito a defesa e a presunção de inocência são pilares da democracia. Qualquer coisa contrária a isso é voltarmos ao obscurantismo, à inquisição. Os opositores também me acusam de problemas relacionados à instalação de antenas de celulares e empreendimentos imobiliários. Mais uma vez, fica evidente a má intenção e o oportunismo. Instalações de antenas de celulares não são de responsabilidade da prefeitura. É uma questão técnica que é controlada e fiscalizada pela Anatel.
Com que objetivo envolveram a sua mulher?
Atingir um prefeito que na campanha do Lula e na campanha da Dilma teve a importância de ser um dos coordenadores do Brasil. E essa foi uma exposição nacional. Tenho o depoimento do presidente Lula, que é público. Tenho o reconhecimento da própria Dilma, que iniciou as relações com os prefeitos e prefeitas na cidade de Campinas. Esse apoio de prefeitos foi decisivo, e o Lula reconhece isso.
O ex-presidente o apoia?
Ele está solidário comigo porque já passou por questões assemelhadas. O Zé Dirceu se solidarizou comigo assim como me solidarizei com ele quando sofreu as agruras dele. Mas não é só ele. O Miro Teixeira, o ministro Orlando (Orlando Silva, do Esporte), o Lupi (Carlos Lupi, ministro do Trabalho), o presidente estadual do PT (deputado estadual Edinho Silva).
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