A crise da intermediação
CLÓVIS ROSSI
FOLHA DE SÃO PAULO - 30/06/11
ATENAS - Uma das coisas que mais chamavam a atenção ontem na praça Syntagma, o coração de Atenas, era a relativa pouca atenção que os "aganaktismeni", os indignados em versão grega, prestavam à decisiva votação que ocorria no Parlamento, o prédio em frente ao acampamento que montaram já faz três semanas exatamente para protestar contra a situação econômico-social do país.
É verdade que havia distrações importantes, na forma de confrontos continuados entre a polícia e os grupos radicais anarquistas, que não pertencem ao acampamento dos "indignados", mas acabam mobilizando a atenção da TV. Afinal, quebra-quebra é mais imagético do que um acampamento pacífico. Além disso, a nuvem de fumaça provocada pelo gás lacrimogêneo forçava todos a se defender, em vez de prestar atenção ao que ocorria no Parlamento.
Mas, de todo modo, a desatenção parece confirmar a avaliação que faz o espanhol Daniel Innerarity, catedrático de filosofia social e política, sobre o movimento espontâneo que está cada vez mais ocupando a praça pública, primeiro no Oriente Médio e agora na Europa: "Há um assalto generalizado contra a ideia da intermediação. Está se instaurando uma visão segundo a qual a vontade geral é algo que se pode construir sem instituições intermediárias".
Pelo menos em Atenas, ontem era assim: os supostos representados davam as costas a seus representantes eleitos, como se tivessem a certeza de que eles, na verdade, já não representam a "vontade geral".
É razoável supor que, ao menos em relação ao Parlamento brasileiro, a sensação do público seja idêntica ou ao menos parecida. Ontem mesmo meu neto me avisou, pelo Facebook, que aderiu a uma manifestação contra a corrupção, gestada, como no caso dos "indignados", no mundo virtual e agora a caminho da vida real.
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