A liberação de Palocci
JANIO DE FREITAS
FOLHA DE SÃO PAULO - 24/05/11
Diante dos antecedentes, não se sabe de onde vem a certeza de José Eduardo Cardozo na inocência de Palocci
A FIXAÇÃO DO GOVERNO em comprometer-se a priori com a alegada inocência de Antonio Palocci, como ontem fizeram com especial firmeza os cinco governadores petistas e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, remete ao fator que liberou o ex-ministro da Fazenda para o enriquecimento, no mínimo, suspeito.
Por ocasião do envolvimento de Palocci com frequência a uma casa alugada por lobistas em Brasília, duas correntes convergiram para protegê-lo. O governo Lula, nada afeito a investigações nem de adversários, e os setores econômicos e financeiros agraciados pelo continuísmo, assegurado por Palocci, das bases neoliberais da política anti-inflacionária de Fernando Henrique/Pedro Malan.
O governo se recusava a qualquer indagação sobre a casa e seus frequentadores; na defesa menos silenciosa, era induzida a explicação de que a casa se destinava a testar talentos femininos.
Com o abuso da violação ilegal do sigilo bancário de Francenildo Costa, o caseiro, veio a segunda etapa da proteção. Não houve como evitar a queda de Palocci, mas o governo e o paloccismo do "mercado" limitaram o ato ilegal a uma precipitação mal dividida entre o presidente da Caixa, Jorge Mattoso, e o ministro. A ordem, de fato, partiu de Palocci.
Os testemunhos ofereceram, porém, numerosas referências a reuniões, na casa, de um grupo de homens com o ministro da Fazenda. Identificados como integrantes do grupo de Palocci quando prefeito de Ribeirão Preto, todos ligados a negócios não definidos, e muito menos citáveis. Um certo Buratti, ao menos ele, complicado em transações da prefeitura de Palocci, motivos de inquéritos e processos com a inclusão do ex-prefeito. Outro participante, assessor do então ministro na Fazenda, já muito doente (morreria pouco depois), em tal condição desmentia a finalidade maior atribuída à casa.
As revelações sobre os encontros dos lobistas com o ministro tinham um antecedente. Ao depor, com a presença do Ministério Público, em inquérito sobre negócios com a Prefeitura de Ribeirão Preto, aquele mesmo Buratti deixara indícios inconvenientes ao grupo e, nele, ao ex-prefeito Palocci. O representante do Ministério Público foi objeto de reprimendas por isso, sob a acusação de forçar um interrogatório duro para satisfação dos repórteres.
A Buratti não foi feita reprimenda alguma, pelo que fez ou pelo que narrou. Mas, passada a fase mais escandalosa da quebra de sigilo bancário, e já réu no caso de Ribeirão Preto, repetiu por várias vezes que o importante no caso de Brasília seria investigar os motivos das reuniões sigilosas na casa. E, claro, seus desdobramentos. Era um complemento definitivo aos testemunhos e indícios acumulados.
Com tantos elementos factuais, e não meras suposições, a requerer a investigação legalmente recomendada em defesa da moralidade administrativa, nada foi questionado a ninguém do grupo. Tudo foi abafado tão logo Palocci caiu. Portador, porém, da correta certeza de que recebera, com a proteção, o atestado liberatório para seguir à vontade em uma de suas atividades.
Mas, diante de tais antecedentes e das notícias atuais, não se sabe de onde vem a certeza do ministro José Eduardo Cardozo e dos governadores petistas na inocência celestial do seu protegido hoje como foi ontem.
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